São Paulo, domingo, 28 de julho de 1996 |
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Em busca do movimento interior
BETTY MILAN
Folha - Li que a sra. vai para os Estados Unidos. Sarraute - A Universidade de Nova York me pediu conferências. Nos últimos anos, eu tenho dado. Respondo às questões dos estudantes. Também vou à Universidade de Colúmbia. Vou ficar uma semana. Adoro Nova York e os Estados Unidos em geral. Estou felicíssima de ir. Folha - E para o Brasil, a sra. gostaria de ir? Sarraute - Adoraria. Estive no Brasil em 1966. Fiquei muito tempo. Fui à Bahia, ver o Jorge Amado. Ele me deu uma estatuetazinha que ainda tenho aqui, aliás. A casa dele era linda! Folha - O que foi que a agradou na Bahia? Sarraute - O mercado e a cidade, muito bonita. Depois de Salvador, fui a Recife. Folha - A sra. encontrou Gilberto Freyre, o autor de "Casa Grande e Senzala"? Sarraute - O livro, eu conheço, mas não cheguei a encontrar Gilberto Freyre. Folha - Existe agora uma fundação no Recife com o nome dele, e eles lá só estudam os trópicos. Sarraute - Os tropismos, não... Folha - Pois é. (risos) Sarraute - Estou procurando me lembrar de todas as cidades do Brasil que conheci. Fiquei oito dias no Rio. Gostei muito. Da baía, claro. É no Rio que existe uma praia chamada Copacabana, não é? Folha - Claro. Sarraute - Foi lá que eu estive, num hotel. Folha - Deve ter sido o Copacabana Palace. Sarraute - Era um hotel muito clássico, maravilhoso. Folha - A sra. chegou a conhecer a escritora Clarice Lispector? Ela também tentou dar conta dos movimentos interiores e rompeu com a idéia de intriga tradicional. Foi publicada na França pelas Éditions des Femmes. Sarraute - Não, eu não a conheço. Folha - Gostaria de saber o que significa para a sra. entrar na "Pléiade". Sarraute - Significa que é agradável, que todos os meus textos vão estar juntos, o que é muito bom. Folha - Proust diz que ele passou a não mais temer a morte a partir do momento em que se deu conta de que ia fazer uma obra. O que a sra. acha disso? Sarraute - Acho muito estranho. Porque a obra não pode me compensar da desaparição de tudo, ela não pode substituir a vida. A morte é outra coisa para mim. Não há nenhuma relação. Folha - A sra. declarou que não gosta de ser entrevistada sobre seu novo livro, nem sobre sua vida. Sobre o que a sra. gosta de falar quando é entrevistada? Sarraute - Não gosto de entrevistas. É muito difícil explicar numa linguagem jornalística o que eu só fiz com muito trabalho. Impossível comentar o meu próprio livro. Folha - Não pedirei isso à sra. Sarraute - Também não gosto de falar da minha vida privada. Folha - Por que a sra. dá entrevistas? Sarraute - Porque acho que, quando a gente publica um livro, tem que entrar no jogo ou, senão, não publica. Dou entrevistas, mas confesso a você que não gosto disso. Notas: 1. "Ici" (Aqui) foi publicado pela Editora Gallimard. 2. Nathalie Sarraute se refere aos diálogos que os autores aprestam, mantendo-se sempre à distância dos personagens e limitando-se a reproduzir as palavras destas, seguidas de um monótono "disse X" ou "respondeu Y". Texto Anterior: Livro reúne depoimentos de autores Próximo Texto: Segredos compartilhados Índice |
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