São Paulo, terça-feira, 30 de julho de 1996
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Sucessor de Cavallo recebe pressões

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES

O novo ministro argentino da Economia, Roque Fernández, sobreviveu com facilidade ao teste dos mercados, no seu primeiro dia como titular do posto, mas já começa a enfrentar pressões por mudanças na política econômica.
O sinal mais forte foi emitido justamente por um dirigente da UIA (União Industrial Argentina), uma das entidades empresariais que correra a dar respaldo à troca de guarda no comando econômico.
O secretário-geral da UIA, Diego Videla, depois dos elogios de praxe ao novo ministro e seus assessores, ressalva:
"É demasiado liberal para uma Argentina que necessita de um aparato produtivo posto em marcha, com algum planejamento e orientação".
Escola de Chicago
A queixa do dirigente industrial é fácil de explicar: a produção industrial no primeiro semestre foi 2,6% inferior à de idêntico período do ano anterior, o ano em que a economia argentina desabou 4,4%.
Não é apenas o liberalismo do novo ministro que bloqueia medidas oficiais de apoio à reativação econômica.
É também a camisa de força imposta pelo modelo adotado, cuja espinha dorsal é a rígida paridade cambial (US$ 1 vale 1 peso desde abril de 91, período em que a inflação acumulada foi de 51,9%).
A ponto de o economista Eduardo Curia, que foi secretário de Coordenação Econômica no início do primeiro governo Menem, defender uma "saída organizada" desse esquema.
Curia é catastrofista na sua análise:
"Só há duas opções de ferro: a desvalorização indireta através de um ajuste depressivo ou a modificação direta da pauta cambial".
É uma alusão ao fato de que, como não pode mexer no câmbio, por lei e por necessidade econômica, o governo vai forçar a redução dos salários, o que tende a fazer cair também os preços (o "ajuste depressivo" citado por Curia).
Curia talvez seja o único a defender a desvalorização cambial, pelo menos abertamente. Mas aumenta o número de vozes que condicionam o futuro do plano à reativação da economia.
"A estabilidade, doravante, vai depender fundamentalmente de que se possa sair da recessão de uma maneira contundente", escreve o economista liberal Walter Graziano para o jornal especializado "Ámbito Financiero".
Reforça o sociólogo Hugo Haime, titular de uma das empresas de pesquisa de opinião pública mais conhecidas do país: "Alguns valores do plano econômico estão deteriorados".
Nó do desemprego
A deterioração não se deve apenas à anemia da atividade econômica. Mesmo no "boom" dos anos 91 a 94, a Argentina conheceu uma formidável explosão do desemprego, que aumentou 185,7% no período.
É esse nó que o modelo parece incapaz de desatar, o que provoca crescente angústia entre os políticos peronistas.
Ainda mais depois que o partido teve, na eleição para prefeito de Buenos Aires, no mês passado, a sua pior votação na história (18%).
Como há eleições legislativas no ano que vem, o lógico é supor que as pressões políticas para mudanças no plano só tendem doravante a aumentar exponencialmente.
Primeiro sintoma: "O Congresso não vai entrar agora em uma corrida louca de aprovação de leis", avisa o senador Antonio Cafiero. Não é da oposição, mas do peronismo.

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