São Paulo, terça-feira, 30 de julho de 1996
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Calma que o ouro não é tanto...

MATINAS SUZUKI JR.
EDITOR-EXECUTIVO

Meus amigos, meus inimigos, tudo indica que dará Brasil e Argentina na final do fut masculino.
Portugal, hoje, contra a Argentina, deve sentir a ausência de jogadores com mais de 23 anos.
E Zagallo, hoje, precisa observar o Orteguinha e o atacante Lopez, que podem aprontar contra a vacilante linha de defesa "caipira".
A Argentina sofre na qualificatória à Copa de 98, na França, por culpa exclusiva da arrogância, do moralismo e do autoritarismo do técnico Daniel Passarella.
Você já pensou que, do meio-campo para a frente, o escrete portenho poderia estar sendo escalado assim: o príncipe Redondo, o combativo Simeone, o endiabrado Orteguinha e os carrascos Caniggia e Batistuta, lá na frente?
Pois bem, com essa força ofensiva, dá, ainda, até para escalar o Maradona. Que ficaria ali pelo meio-campo, só municiando os artilheiros e correndo para o abraço.
*
O Brasil terá mais medalhas nessa Olimpíada do que nas anteriores. Ok, houve avanços.
Mas está chegando perto do ridículo a histeria no vácuo deste fato, colocando as conquistas no terreno esportivo em um delírio ufanista bem maior do que a realidade.
Sem desmerecer conquistas, é preciso lembrar que, se as medalhas aparecerão em maior número, em compensação, nunca houve uma delegação brasileira com tantos competidores.
Portanto, mais do que um feito heróico inusitado, como quer a histeria reinante, trata-se de uma colheita proporcional ao investimento no plantio (mesmo neste critério, até o quadro publicado ontem pela Folha, o Brasil era o 35º colocado no quesito eficiência. Ontem, era o 18º no total de medalhas. Portanto, ainda longe de ser uma potência no esporte).
Entre as nossas medalhas estão, por exemplo, as de ouro e as de prata no vôlei de praia feminino. Respeito o esporte.
Mas é uma modalidade sem tradição olímpica alguma e que exclui, de cara, países que não têm uma cultura praieira como o Brasil (com tanta praia por aqui, não ser competitivo nesta modalidade pegaria até mal. Aliás, no masculino, o vôlei de praia não correspondeu à expectativa).
Além disso tudo, com Olimpíada ou sem Olimpíada, as duplas femininas de vôlei de praia brasileiras ponteiam o ranking internacional.
(Na verdade, o carnaval da mídia deve-se muito mais a uma carência do que a um fato de heroísmo esportivo: como nunca uma mulher nativa pôde vestir o colar da medalha, as que ganharam viraram deusas de uma hora para outra, graças ao mesmo milagre que fazem todos os dias nos torneios regulares pelas praias do mundo afora).
No caso do iatismo, reduto tradicional de medalhas, lembre-se que ele é o esporte de um país à parte, o país da elites, e sua performance independe totalmente do país real.
Compare com o caso do atletismo, este sim, um esporte que concentra todas as honrarias de um esporte olímpico nobre e universal.
O Brasil foi, novamente, pífio em todas as modalidades. Não obteve nenhuma medalha.
Temos mais quatro dias de Jogos para avaliar definitivamente a posição brasileira. É inegável o progresso -notadamente nos esportes coletivos femininos, onde realmente vimos performances notáveis.
Mas ainda falta muito para o país ser uma potência esportiva -como, enganosamente, celebram os gritos histéricos da mídia.
Aliás, como se sabe, o país precisa de mais história e menos histeria.

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