São Paulo, domingo, 4 de agosto de 1996
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Valeu e não valeu

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES

Valeu ter visto a paraíba feminina Edinanci Silva encarar um teste público de feminilidade e lutar contra os verdadeiros homens, as judocas peso-pesado, categoria que, definitivamente, não é a dela.
Não valeu nem um pouco conviver com os cérebros embalados a vácuo de alguns voluntários e policiais locais, para quem a regra está sempre acima da lógica.
Já a piada do enviado do "Los Angeles Times", sobre a desorganização de Atlanta, valeu: "Estou surpreso que Mohammad Ali não tenha sido incendiado pela tocha".
Não valeu nada ver a bem alimentada e bem paga seleção de vôlei perder para Argentina, Bulgária e Iugoslávia e pôr a culpa na "cabeça".
Mas valeu encontrar e conversar com Mireya Luis, fenômeno do vôlei, que o Brasil deve estar odiando, mas que é uma iluminada e bem-humorada cubana, com sonhos de ser bailarina, fã de Bola de Nieve e Roberto Carlos.
Não valeu -e, felizmente, nem vi um jogo inteiro- acompanhar a ridícula atuação de uma seleção que Zagallo montou de um jeito e desmontou de outro. Um time que só deu tristeza. Novo lema: Brasil, o país do iatismo.
Valeu, de qualquer forma, ver a Nigéria chegar onde chegou, mostrando ao mundo que mamãe África é mesmo a potência emergente do futebol. Jogou com alegria e com velocidade.
E velocidade, como dizem na terra de Matinas Suzuki Jr., é sinônimo de elegância.
Não valeu ver o time de basquete brasileiro, o "Nightmare Team", jogar atemorizado contra o "Dream Team", que é do bom, mas já teve melhor.
Valeu, apesar de tudo, ver Oscar ser tratado com muito respeito -que merece- pela imprensa, público e jogadores norte-americanos.
Valeu ver Carl Lewis provar, a quem ainda não estava convencido, que é mesmo um rei.
Valeu, também, ter visto outro black canadense bater o recorde dos 100 m. Eu que em Seul presenciei a glória e o inferno de Ben Johnson.
Mas, mais do que o outro Johnson, o Michael, ninguém valeu.
Não valeu nem um pouco estar condenado à TV norte-americana, que é tão ou mais patriótica que qualquer outra.
O que valeu, nesse canal, foi a câmera "Forrest Gump", com ótimas tomadas laterais nas corridas.
Realmente não valeu nem um pouco ouvir uma bomba explodir do outro lado da rua.
Valeu, sim, a alegria de ver as mulheres brasileiras ganhando suas primeiras medalhas olímpicas e mostrando que essa gente bronzeada (meu Deus, quanto bronze...) pode ter mais valor.

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