São Paulo, domingo, 4 de agosto de 1996
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A RAIZ DA CÓLERA

As interpretações sobre a queda do ministro da Economia argentino, Domingo Cavallo, são polêmicas. Mas é inescapável constatar que, como pano de fundo para a crise, destaca-se o problema do desemprego.
Foi, aliás, ninguém menos que o ex-todo-poderoso ministro quem veio a público pedir desculpas ao povo argentino pelo sofrimento que suas políticas econômicas causaram.
Nesta segunda-feira, 5 de agosto, chega à Argentina mais uma missão do FMI para repactuar metas de ajuste fiscal. Estará no país a tempo de assistir, no dia 8, a uma greve geral convocada pelas três principais centrais sindicais. Em Córdoba, na semana passada, as manifestações deixaram um saldo de 20 feridos.
Multiplicam-se também na Argentina os crimes, mais ou menos organizados. Os meios de comunicação dão espaço crescente a denúncias de corrupção. A igreja reclama mudanças na política econômica.
Mas a crise do emprego não é exclusividade argentina. O número médio de demissões na França é, hoje, de 35 mil por mês, algo que o periódico "Le Monde" qualifica de "hemorragia social". O banco central francês reduziu os juros e o governo estuda políticas sociais de emergência.
A França já perdeu mais de 1,8 milhão de empregos industriais e a taxa de desemprego de 12,3% é um recorde histórico. Mas, de outubro de 1995 a julho último, as taxas de juros caíram de 7% para 3,5%, sem que o desemprego tenha diminuído.
A situação na França e na Argentina talvez pareça ser apenas coincidente. Fatos de uma época de desemprego estrutural. Mas nos dois casos há sujeição a modelos de política econômica fortemente condicionados por restrições externas: a taxa de câmbio fixa na Argentina, as metas orçamentárias de Maastricht na França.
Não há saídas fáceis e, supõe-se, no longo prazo a inserção competitiva das nações em blocos econômicos poderá trazer benefícios e tornar a globalização mais virtuosa.
Suportar os custos do ajuste no curto prazo, entretanto, é hoje o maior desafio político tanto nos países desenvolvidos quanto nos mercados emergentes. E o desemprego crescente, como lembra o mesmo "Le Monde", é a raiz da cólera.

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