São Paulo, domingo, 4 de agosto de 1996
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A democratização do crédito

ANTONIO KANDIR

Não é segredo para ninguém que a desejável modernização da economia tem uma indesejável contrapartida social. Com a incorporação crescente de novas tecnologias e formas de produção, cresce o desemprego estrutural, assim chamado porque não se deve a fatores conjunturais, mas sim à eliminação definitiva de postos de trabalho em decorrência do progresso técnico.
Isso nos coloca, governo e sociedade, frente ao desafio de encontrar alternativas concretas para a geração de renda e ocupação profissional. Em outras palavras, frente ao desafio de formular políticas que permitam ao maior número de pessoas, com base em seus talentos empresariais específicos, montar, manter e ampliar seus próprios negócios, sejam pequenas confecções, cooperativas de costureiras, marcenarias, ferramentarias etc.
Com esse objetivo, o governo do presidente Fernando Henrique lançou no último dia 29 de julho o Programa de Crédito Produtivo Popular.
A experiência mostra que, pelos canais convencionais de mercado, o crédito é inacessível ao pequeno empreendedor, seja por conta das exigências, seja por conta dos custos financeiros. Para resolver esse problema, é necessária a ação do Estado, por meio de um programa específico, cuja engenharia institucional e financeira permita a efetiva democratização do acesso ao crédito.
Para funcionar, o programa tem de ser simples, descentralizado, construído com base em parcerias entre níveis de governo e entre o governo e organizações da sociedade, e contar com uma importante alavanca inicial, pois só assim torna-se possível deslanchar a oferta de crédito, com custos e exigências reduzidos, em múltiplos pontos do país.
O Programa de Crédito Produtivo Popular cumpre todos os requisitos mencionados acima. O governo federal comparece com a principal alavanca, o BNDES, que terá de início cerca de R$ 70 milhões para aplicação no programa. Os recursos aportados pelo banco terão remuneração bem abaixo e prazo de carência bem acima dos observados no sistema financeiro, o que permitirá ao pequeno empreendedor obter o crédito em condições francamente mais favoráveis.
A participação do BNDES permitirá alavancar a participação de Estados e municípios, dos quais exigem-se não apenas contrapartidas de recursos para formação de fundos de investimento, mas também a constituição de comissões para melhor detecção das prioridades locais e maior segurança quanto à efetiva chegada dos recursos ao público-alvo.
Acresce que o programa, de modo inovador, incorpora a participação ativa de organizações não-governamentais com reconhecida experiência na concessão de crédito popular, como forma de torná-lo ainda mais descentralizado e efetivo na destinação do crédito ao público visado.
Para completar, prevê ainda a inclusão dos seus beneficiários às iniciativas de qualificação e requalificação profissional das secretarias estaduais e municipais do Trabalho, como forma de assegurar o vínculo entre crédito e capacitação gerencial.
Registre-se, por fim, que o programa cumpre todos esses requisitos de simplificação, flexibilidade, descentralização, sinergia e participação sem descuidar dos requisitos técnicos básicos e indispensáveis à sua auto-sustentação financeira, ditada por seu caráter definitivamente não-assistencialista.
Dessa maneira, boas idéias, que antes morriam no nascedouro por falta de um pouco de dinheiro apenas (os empréstimos serão limitados a R$ 5.000, para pessoas físicas, e R$ 25 mil, para cooperativas), poderão, de agora em diante, materializar-se em múltiplos pequenos negócios, gerando renda e ocupação para um número crescente de pessoas.

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