São Paulo, quinta-feira, 8 de agosto de 1996
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Alertas e conselhos

CELSO PINTO

Qual o limite sensato para o Brasil usar o câmbio como âncora antiinflacionária, sem chegar a uma crise externa? E o que poderia ser colocado como âncora no lugar do câmbio?
Não há uma resposta única a essas questões, mas duas intervenções ontem no encontro da Sociedade Econométrica, no Rio, dão farto material para reflexão.
O professor Assaf Razin, da Universidade de Telavive, fez um estudo de dez episódios, em seis países, nas últimas décadas, que tiveram déficits em suas contas externas superiores a 5% do PIB. Teoricamente, um buraco em conta corrente maior do que esse deveria ser sinônimo de crise.
Para a América Latina, depois da crise do México, em 94, o limite considerado sensato é menor: 3% do PIB. O Brasil usa esse indicador, não oficialmente.
O estudo traz boas e más notícias. As boas são que existem exemplos de países que superaram os 5% e se deram bem, como a Irlanda, a Coréia, Israel e, especialmente, a Austrália, que manteve déficits em conta corrente altos por quatro décadas.
As más notícias são que, para evitar a crise, é preciso cumprir certos pré-requisitos. Olhando os casos, Razin tentou descobrir quais os sinais de alarme que indicariam fortes chances de uma crise. Simplesmente olhar o que o mercado está fazendo não é o bastante. É preciso olhar os fundamentos das economias.
Três variáveis podem acender o sinal vermelho: ter baixa taxa interna de poupança, baixas exportações e uma moeda sobrevalorizada.
O que é baixa poupança não está definido, mas Razin diz que os países asiáticos, onde a poupança supera 25% do PIB, são um bom parâmetro. No Brasil, ela está em 18% do PIB.
Nos exemplos estudados, o comportamento fiscal não foi conclusivo. O Chile entrou em crise apesar de ter superávit fiscal, enquanto Israel evitou a crise mesmo tendo déficit fiscal. Razin alerta, contudo, que, ainda assim, a questão fiscal não pode ser negligenciada. Olhando a posteriori, o desequilíbrio fiscal está presente em muitos casos de crise.
Para evitar a crise externa, um país teria de ter ainda uma taxa robusta de crescimento, um grau razoável de abertura comercial e um sistema bancário em boa forma. Se o setor bancário está frágil, como no México em 94, a reversão do fluxo de capital gera um colapso.
Crises surgem de choques externos, que fazem estancar o fluxo de capitais. Razin diz que o pior choque possível no horizonte para o Brasil e outros países latino-americanos seria uma elevação dos juros americanos -o mesmo fator que detonou a crise do México em 94.
O Brasil, com um déficit em conta corrente de 3% do PIB, atende a alguns pré-requisitos para fugir da crise, mas não a outros.
Lars Svensson, da Universidade de Estocolmo, na Suécia, fez uma análise da experiência de sete países (Nova Zelândia, Austrália, Canadá, Grã-Bretanha, Suécia, Finlândia e Espanha) que usam como meta única para o Banco Central uma taxa de inflação, tipicamente 2% ao ano, com tolerância de 1% para mais ou para menos.
A experiência mais antiga data de cinco anos, portanto é algo recente. De todo modo, até agora tem sido muito bem sucedida: dá clareza à atuação do BC e à cobrança de resultados. Não é fácil de implementar e leva de 1,5 a 2 anos para gerar resultados (usando os juros como instrumento). Além disso, está sujeita a fatores que fogem do controle do BC.
Ainda assim, Svensson acha que tem enormes méritos e que usar metas intermediárias pode ajudar na implementação. Poderia ser uma alternativa para países que usam o câmbio como âncora, como o Brasil?
Svensson acha que sim, ainda que a transição talvez seja complicada, se o câmbio gerou desequilíbrios externos. Uma boa pré-condição seria dar independência ao banco central.
Merton Miller, o prêmio Nobel em economia de Chicago, deveria ser a estrela máxima do encontro de Econometria, mas um problema de saúde impediu-o de vir. Mandou, de todo modo, um trabalho para ser lido, provocativo e bem humorado, como é seu estilo.
Nele, Miller lista todos os "escândalos" gerados por operações em mercados derivativos (mercados futuros e de opções). E se pergunta: qual foi o custo social das bancarrotas? Sua conclusão é simples: não houve custo algum porque, em todos os casos, grandes perdas de empresas como Procter & Gamble e Barings foram contrabalançadas por grandes lucros de alguém na ponta oposta. Portanto, conclui, não há porque regular mais os derivativos.
A nova grande estrela do encontro deverá ser Domingo Cavallo, ex-ministro da Economia argentina, que inesperadamente prometeu vir e falar hoje.

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