São Paulo, sábado, 10 de agosto de 1996
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Governo tenta desviar atenções da greve

DANIEL BRAMATTI
DE BUENOS AIRES

O governo argentino manteve ontem silêncio absoluto sobre as exigências dos sindicalistas que promoveram, na véspera, a maior greve geral dos últimos oito anos.
A direção da CGT (Confederação Geral dos Trabalhadores) desmentiu ter sido convidada para reuniões com os ministro Roque Fernández (Economia) e Alberto Caro Figueroa (Trabalho).
Anteontem, Caro Figueroa disse que o governo estaria disposto a negociar mudanças no decreto que reduziu ou eliminou o pagamento do benefício do salário-família.
A medida, idealizada pelo ex-ministro Domingo Cavallo (Economia), reduziu a renda de pelo menos 1,8 milhão de trabalhadores.
A única iniciativa oficial de ontem foi encarada como uma manobra para mudar o foco das atenções. O ministro da Justiça, Elias Jassan, convocou uma entrevista coletiva para anunciar que o governo pediu a prisão do empresário Alberto Samid, acusado de sonegar US$ 80 milhões em impostos.
Samid, que atua no setor de exportação de carne bovina, foi deputado pelo Partido Justicialista (peronista) e costuma se apresentar como amigo do presidente Carlos Menem.
Manobra
"O governo está enganado se pensa que o povo vai se distrair com manobras", disse à Folha o líder do MTA (Movimento dos Trabalhadores Argentinos), Juan Manuel Palácios, ao comentar a denúncia contra Samid.
O sindicalista reclamou da repressão policial contra as manifestações do MTA. No total, 54 grevistas foram presos e alguns tiveram de ser medicados. O ministro do Interior, Carlos Corach, terá de explicar no Congresso a aplicação das medidas de força.
Para Palácios, o sucesso da greve está relacionado com a decisão do ministro Roque Fernández de adiar para a próxima semana a divulgação do pacote fiscal contra o déficit público.
"Pelo que sabemos, o pacote vai reduzir ainda mais o poder aquisitivo da população, ao aumentar os impostos sobre os combustíveis", disse o sindicalista.
Outra medida esperada é o possível aumento das contribuições trabalhistas patronais. A UIA (União Industrial Argentina) já se manifestou contra.
Segundo a entidade, o aumento provocará a queda da competitividade dos produtos argentinos no exterior.
Sonegação
A iniciativa do governo de tornar pública uma denúncia judicial contra um empresário é inusual. Normalmente, os processos envolvendo sonegação tramitam em sigilo absoluto.
Além do ministro da Justiça, participaram da entrevista coletiva o chefe da DGI (Direção Geral Impositiva), Carlos Sánchez, e o secretário da Agricultura, Felipe Solá.
Na quarta-feira, o titular do Departamento de Assuntos Fiscais do FMI (Fundo Monetário Internacional), Vito Tanzi, havia pedido a Roque Fernández um endurecimento do governo contra os sonegadores.
Alberto Samid foi denunciado, juntamente com dois irmãos, por associação ilícita com o objetivo de sonegar.
A DGI o acusa de possuir 28 empresas em nome de "testas-de-ferro", além de se beneficiar de devoluções irregulares de impostos.
O setor de carnes é o principal alvo dos fiscais da DGI atualmente. O ex-ministro Cavallo estimou em US$ 600 milhões o total sonegado anualmente pelos frigoríficos argentinos.

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