São Paulo, domingo, 11 de agosto de 1996
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Atlanta e Tiririca

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

A Olimpíada de Atlanta foi a primeira totalmente privada. Não houve dinheiro nem ingerência de esfera pública na organização do evento.
Foi a Olimpíada do corpo neoliberal, com o logotipo do "sponsor" tatuado no braço ou impresso em lentes de contato.
Puristas criticaram o excesso de comercialismo. Muita marca, muita empresa, muita corporação multinacional competindo sob bandeiras nacionais. É inevitável que tenha sido assim.
A questão a ser levantada é outra: o fato de que a Olimpíada, em termos de organização e tecnologia, tenha ficado muitos furos abaixo da propalada eficiência do setor privado.
É impressionante que uma empresa com o porte e o renome da IBM, responsável pelas informações online de um evento que atrai atenções de todo o planeta, tenha sido obrigada a devolver dinheiro por não ter conseguido cumprir o que prometeu.
Um desgaste desastroso, num setor de ponta, ultracompetitivo, como é o da informática.
Durante os Jogos, o prefeito de Atlanta já ensaiava uma "autocrítica" sobre seu distanciamento da organização.
Acreditava que a prefeitura poderia ter organizado melhor o serviço de ônibus e direcionado as obras para um aproveitamento futuro mais racional por parte da cidade.
O perigo dos erros de Atlanta é levar ao raciocínio inverso, especialmente no Brasil, país onde impera o patrocínio público.
Para a Rio 2004, por exemplo, os problemas vão servir para reforçar o discurso da participação governamental.
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E o Tiririca, essa bizarra reencarnação do Zacharias? Querem colocar o banguela "racista" na cadeia.
É conhecida a presença do preconceito na música popular brasileira -a "nega do cabelo duro", a "mulata assanhada", o "crioulo doido".
Nelsinho Motta, que é do ramo e adora cultura negra, me contava em Atlanta que torcedores brasileiros, no jogo contra a Nigéria, gritavam para os africanos coisas do tipo "sai daí, macaco!" ou "sai pra lá, negão!".
Ouvi um técnico de vôlei dizer a um ex-jogador, sobre a cubana que agrediu a jogadora Ana Paula: "Me deu vontade de pegar aquela macaca e encher de cacete".
Como se do lado de cá, na quadra, no campo, no país, fôssemos uma nação de louríssimos macacos suecos.

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