São Paulo, terça-feira, 13 de agosto de 1996
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Todos iguais perante as multas

ABRAM SZAJMAN

É óbvio que a sociedade brasileira apóia o Real. Dos mais velhos, os poucos a conhecer moeda estável no passado, aos mais jovens, nascidos e criados em ambiente de inflação alta ou altíssima.
O comportamento de produtores e consumidores revela maturidade e elevado grau de adaptação à nova realidade. A sociedade está no seu direito de cobrar do governo, em todos os níveis, igual atitude. É a oportunidade para o governo demonstrar que confia em suas próprias iniciativas e já se considera capaz de respeitar, na administração de suas contas, as regras que estabeleceu para o setor privado.
No dia 1º de agosto, o presidente Fernando Henrique sancionou a lei que limita as multas por atraso de pagamento a 2%, para produtos e serviços. Há muitas dúvidas sobre a abrangência da lei, o que deverá ser esclarecido na regulamentação, a cargo da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça.
Parece claro, entretanto, que, no setor privado, salvo algumas exceções, como aluguéis e condomínios, regulados por legislação especial, todos os contratos terão que se enquadrar nos limites da nova lei e não estipular multa de mora acima de 2%.
Em sucessivas entrevistas à imprensa, tenho dito que o comércio não vive de multas. Da grande loja de departamento à lojinha, o interesse do empresário é vender com uma margem que lhe permita repor os estoques, pagar seus compromissos fiscais e financeiros, além de guardar algum, se possível, para reinvestimento.
A multa tinha e tem claro sentido punitivo para inibir o atraso de pagamento. Inadimplência, na empresa, significa um risco muito alto. Por exemplo, a perda do crédito junto aos fornecedores, o título do banco no cartório, a impossibilidade de pagar os salários pontualmente aos seus dedicados funcionários. A multa é, seguramente, uma precaução. Mas o empresário vai cumprir a lei.
E o setor público? As multas fiscais da União, Estados e municípios, nos níveis atuais, foram estabelecidas na época da inflação na casa dos 50%, 60% e até 80% ao mês. As multas de mora, no terceiro mês, chegam a 30% do valor do débito.
Além das multas, é preciso levar em conta os juros de mora. Até o final de 1994, a taxa era de 1% ao mês. A partir de 95, os juros passaram a ser cobrados com base na Taxa Referencial do Selic (Over) para títulos federais. O percentual das multas parte de um mínimo de 50% para ultrapassar 100% em certos casos. Essas taxas, na atualidade, com o real estável, significam um verdadeiro confisco.
Nada justifica a manutenção de multas nesses níveis. Se o real mantém seu valor no bolso do trabalhador, também o mantém nos cofres públicos.
O cidadão comum, a dona-de-casa, o estudante mantêm dinheiro na conta corrente. Os que têm sobras fazem aplicações no mercado financeiro aceitando as taxas baixas de remuneração que são oferecidas. É coisa do passado aquela compulsão de se livrar do dinheiro o mais depressa possível, comprando qualquer coisa. Como disse acima, produtores e consumidores apóiam o Real. É hora de o governo fazer o mesmo.
Esse problema é pauta obrigatória nas reuniões de empresários na Federação do Comércio. Daí resultou a decisão de mobilizar os 137 sindicatos filiados à FCESP para uma campanha em favor da igualdade de tratamento com relação às multas. Entidades da sociedade civil, consultadas, mostraram interesse em participar da campanha. Estou certo de que o governo compreenderá o alcance deste movimento, uma vez que se reivindica o mínimo: igualdade de tratamento.

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