São Paulo, quinta-feira, 15 de agosto de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Avaliação sobre Cavallo

LUÍZ NASSIF

É curiosa a avaliação produzida por alguns setores sobre o ex-ministro da Economia da Argentina Domingo Cavallo.
A coluna ousou dizer que Cavallo vai merecer lugar na história do continente, e levou pau de alguns lados, em cima de um mesmo bordão: Cavallo foi um fracasso porque congelou o câmbio. E pronto. Simples e definitivo.
Como avaliar, no plano Cavallo, a fixação do câmbio argentino assim no ar, sem uma análise das circunstâncias em que ocorreu?. Um ônibus perde o freio num despenhadeiro, com o motorista desmaiado ao volante. Um passageiro consegue pegar a direção, consegue controlar o ônibus, mas é multado por um guarda de trânsito porque o ônibus andou no acostamento.
É a mesma coisa.
Com o fim do regime militar, é eleito Alfonsín, que não conseguiu evitar que a economia ingressasse em período de crises hiperinflacionárias seguidas.
A falta de governabilidade era de tal ordem que Alfonsín sequer terminou seu governo. Permitiu a eleição de um lídimo representante do peronismo que em menos de seis meses também esgotou seu cacife político.
Ameaças concretas
O que se seguiria à deterioração de um governo recém-eleito? Como ficaria a economia e, mais que isso, a democracia argentina e do continente?
É nesse ambiente que tem-se que analisar a ação de Cavallo. Trata-se da maior aposta até hoje feita por um ministro da Economia do continente: fixou o câmbio por lei e acabou com a autonomia do governo argentino em emitir moeda. O Banco Central só poderia emitir austrais (depois pesos) como contrapartida aos dólares que entrassem no seu caixa.
Com esse lance, interrompeu o processo hiperinflacionário e deu alguns anos a mais de lambujem para a Argentina encontrar seu rumo.
Qual era o desafio lançado por Cavallo? O governo não poderia mais emitir para financiar seu déficit fiscal. Portanto, só lhe restava a alternativa de equilibrar o orçamento.
O câmbio não poderia ser manejado para conferir competitividade às exportações. Portanto, os exportadores teriam que se virar com aumentos de produtividade e redução do custo Argentina.
Não há dúvida que acabou com a capacidade do governo de manobrar a política fiscal e monetária. E que, com o tempo, o engessamento do câmbio produziria recessão -se não se conseguisse reduzir o custo Argentina.
Portanto, havia uma corrida contra o tempo, que consistiria em promover as reformas capazes de levar ao equilíbrio fiscal e à recuperação da competitividade das exportações argentinas.
Sem tempo
A modernização avançou em muitos setores, e virou dado irreversível na economia nacional. Mas não avançou na intensidade e na velocidade necessárias, entre outras coisas pela falta de respaldo à ação de Cavallo.
O pacote econômico anunciado esta semana limita-se a aumentar impostos, como confissão do fracasso do governo em enxugar a máquina.
Mas quais as alternativas sugeridas por alguns dos gênios que agora criticam Cavallo?
No Cruzado 2, em circunstâncias muito menos dramáticas, decretaram moratória da dívida externa, e só. Não previram sequer o lance seguinte.
O problema do atraso do câmbio não está no Plano Cavallo. Está nos "macaquitos" nacionais, com base no seguinte raciocínio: como o Plano Cavallo vale para uma economia na UTI, vamos jogar a nossa na UTI, para podermos imitar o plano.

Texto Anterior: Câmara chilena dá aval ao Mercosul
Próximo Texto: Kaiser vai construir fábrica no CE
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.