São Paulo, sexta-feira, 16 de agosto de 1996
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Clássico custa pouco mais que uma Coca

ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL

Falta de dinheiro, desta vez, não é desculpa para deixar de ir à Bienal do Livro.
Pelo preço de um cinema no shopping (R$ 10), você paga o ingresso da feira (R$ 5) e ainda compra dois clássicos da literatura brasileira ou internacional.
Entre os gêneros que não agridem o bolso, estão poemas de Camões, crônicas de Nelson Rodrigues, contos de Machado de Assis e uma peça de Shakespeare ("Macbeth").
A 14ª edição da Bienal -que abre hoje para o público, às 17h, no Expo Center Norte, em São Paulo- tem, à primeira análise, vocação superlativa.
Ocupará uma área de 43 mil metros quadrados, oferecerá 152 mil títulos e deverá atrair 1,5 milhão de visitantes. O volume de negócios poderá beirar a casa dos US$ 75 milhões.
Mas ironicamente, num universo de cifras tão expressivas, o destaque fica por conta de 31 livrinhos. O diminutivo, aqui, não guarda nada de pejorativo. São livrinhos mesmo -pequenos no tamanho (possuem menos que 20 centímetros de comprimento) e minúsculos no preço. Custam entre R$ 1,50 e R$ 3.
"Nunca a feira pôs à venda títulos tão baratos. Está colocando agora porque o mercado editorial finalmente resolveu quebrar o tabu de que, no país, literatura boa é literatura cara", diz Altair Ferreira Brasil, presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL), organizadora da Bienal.
Acessíveis
A Mantiqueira, pequena editora de Campos do Jordão (SP), oferece os dois volumes mais acessíveis de todo o evento. "Frederica vai à Lua" e "A Gata Mícholas e a Praça" saem, cada um, pelo preço de uma Coca-Cola em lata: R$ 1,50.
Com 16 páginas e ilustrações coloridas do chinês Wei Zhi Ren, os livros pretendem atingir crianças entre 5 e 8 anos.
O próprio dono da Mantiqueira, Antonio Costella, escreveu as histórias (em "Frederica Vai à Lua", teve a colaboração da mulher, Leda Campestrin).
"Fui professor durante quase três décadas", conta o editor. "E sempre escutei de meus alunos a reclamação de que não lêem porque livro pesa no bolso. Resolvi, então, combater o mal pela raiz. Lanço títulos baratos e os destino às crianças, na esperança de lhes despertar precocemente o hábito da leitura."
Espírito parecido move a Ediouro, que está publicando quatro clássicos da literatura brasileira por R$ 1,80 e com texto integral (veja lista nesta página).
"Queremos alcançar o consumidor de baixa renda que, depois do Plano Real, passou a comer frango todos os dias. Se matou a fome física, precisa saciar também o apetite cultural", afirma Paul Christoph Jr., diretor da editora carioca.
A meta da Ediouro é colocar em circulação quatro volumes novos por mês, sempre custando R$ 1,80. Na Bienal, lança Vinicius de Moraes, Nelson Rodrigues, Machado de Assis e Rubem Fonseca. Em setembro, abre espaço para Fernando Pessoa, Eça de Queirós, Franz Kafka e Dostoievski.
A Paz e Terra também decidiu apostar nos clássicos e inaugurou a coleção Leitura, com 25 títulos e inspirada em uma série de livros da editora inglesa Penguin.
Há desde o Manifesto Comunista até um ensaio econômico de Celso Furtado, crônicas do jornalista Antônio Maria, contos de Oscar Wilde e uma peça de Molière. Preço de cada exemplar: R$ 3.
Milagre? Nem tanto. Para baixar os custos das publicações, os editores recorrem a artifícios muito comuns em outros países.
Substituem o papel off-set habitual por outro mais barato: o papel jornal. Diminuem o formato de cada volume (fazem os chamados "livros de bolso") e rodam tiragens altas, com pelo menos 10 mil exemplares.

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