São Paulo, sexta-feira, 16 de agosto de 1996
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'Stomp' é superficial e envolvente como um comercial

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Percussão, sapateado, comédia, resvalando pelas artes. "Stomp" é o espetáculo multimídia na sua própria definição.
Tem de tudo um pouco, lembrando por vezes os trabalhos do gênero no final dos anos 80, como o "Suz/O/Suz" do catalão La Fura dels Baus, ou alguma exibição mais virtuosística de Fred Astaire nos anos 40 e 50, com uma vassoura, por exemplo.
O que diferencia "Stomp" é, talvez, a sua superficialidade. Os esquetes se repetem, se repetem, com tiradas, sacadas de poucos segundos, mais nada.
Algumas, vistas no exato momento, geniais. Por exemplo, o ritmo tirado do lixo, de sacos plásticos, copos usados, no que é talvez a essência ou a origem do espetáculo. Ou ainda, em passagem mais contida, o ritmo a partir de isqueiros, reunindo luz e som.
Mas são sacadas de alguns poucos segundos, mais nada. Envolvem como um bom comercial, uma propaganda.
Não é à toa, certamente, que no currículo da companhia britânica Yes/No People abundam os comerciais.
Mais do que este ou aquele espetáculo, sobressaem os anúncios de televisão para a cerveja Heineken ou para as lojas Target.
Ou ainda, em outra vertente, as aparições também de poucos segundos em espetáculos alheios, caso da tão comentada festa de entrega do Oscar.
Mas "Stomp", por outro lado, merece o que escreveram dele, toda a repercussão que alcançou, desde o início, cinco anos atrás, em Londres.
A cada novo esquete, a companhia, um dos quatro elencos reunidos pelos criadores e diretores (e publicitários) Luke Cresswell e Steve McNicholas para correr o mundo, cresce o envolvimento do público -que participa, senão de um ritual, certamente de uma festa, com as palmas dirigidas pelo protagonista Dashiell Eaves, um mestre de cerimônias.
Se estiver correto o programa do espetáculo, Eaves e Anthony Sparks, o mais expressivo, chegam mesmo a compor personagens ou algo parecido.
Chegam perto do teatro -e também não é à toa que "Stomp" tenha surgido no Sadler's Wells, teatro de grande influência nas montagens shakespearianas desde o século 18, em conjunto, sintomaticamente, com atrações circenses, no que se poderia chamar de multimídia avant la lettre.
Aliás, a própria cenografia, por estranho que pareça, guarda muito do palco elisabetano.
O que alinhava "Stomp" não é, claro, a dramaturgia, ou um enredo, uma trama. Mas há elementos dispersos que ajudam o espetáculo a ser algo mais do que um amontoado de quadros.
Quanto à temática, assim, toda a criação de ritmos se dá com objetos do cotidiano, melhor dizendo, talvez, das ruas. A lata de lixo, o próprio lixo, a vassoura, o balde, até um tanque de lavar roupa, na cena de maior nonsense -e riso- do espetáculo.
Também uma certa ambiência de urbanidade multicultural -não faltando, no elenco, dois brasileiros.
Também na comédia, é possível achar um recurso unificador no "slapstick", o pastelão, o humor físico -já que texto, fora algumas palavras decoradas em português, não existe.
Envolvente, fascinante, mas também superficial e, no limite do tempo, repetitivo.

Espetáculo: "Stomp"
Criação: Steve McNicholas e Neil Tiplady
Direção de elenco: Vince Liebhart
Quando: até amanhã, às 21h; domingo, às 16h e 20h
Onde: teatro Sérgio Cardoso (r. Rui Barbosa, 153, tel. 288-0136)
Quanto: R$ 40,00 e R$ 50,00

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