São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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Funai e PF trocam acusações

DO ENVIADO ESPECIAL A BOA VISTA

A Fundação Nacional do Índio e a Polícia Federal não se entendem sobre o que fazer com os garimpeiros que estão invadindo a reserva ianomâmi.
Para a PF, os missionários estrangeiros, contra os quais a Funai nada faria, são mais "perigosos" do que os garimpeiros.
A superintendente da PF em Roraima, Sueli Goerisch, considera o garimpo "um problema, mas é o terceiro ou quarto item em prioridade". Para ela, os números da Funai sobre a invasão da reserva estão superestimados.
"A Funai tem que deixar de balela e começar a trabalhar. O maior problema são essas entidades que entram para catequizar os índios", diz Goerisch.
A delegada disse que pediu informações à Funai sobre os catequizadores e que recebeu como resposta um administrador: "Não vou mexer com eles, porque são poderosos e não quero perder meu emprego".
'Lobby forte'
O administrador da Fundação Nacional do Índio em Roraima, Manoel Tavares, 41, confirmou à Folha que, "embora discorde do trabalho de catequese dos índios", não está disposto a mexer com os missionários estrangeiros.
Tavares confirma o diálogo narrado pela superintendente da PF, mas faz uma ressalva: "A conversa não foi com ela, foi com o agente Sérgio".
Segundo o administrador da Funai, ele teria dito: "Se você quer comprar briga com essa gente, você compra. Eu não vou mover nada para por alguém fora da área. Eles têm um lobby forte no Congresso e eu não vou perder o meu emprego".
Tavares disse que preparou a lista dos catequizadores estrangeiros que trabalham na reserva ianomâmi, mas a PF até hoje não foi buscar a relação.
São 19 missionários -13 americanos, 3 portugueses, 1 alemão, 1 argentino e 1 queniano.
Os missionários trabalham nas áreas de educação, saúde e religião. "Eles tentam catequizar os índios, mas não conseguem. Eu sou contra esse trabalho, mas eles chegam aqui com autorização do Itamaraty. O que eu vou fazer?", disse Tavares à Folha.
A PF e a Funai também não se entendem sobre o número de garimpeiros dentro da reserva. Os números também não batem com os do Sindicato dos Garimpeiros de Roraima.
Para a delegada, não passa de 250 o número de invasores. Ela não acredita que o número aumente com a seca.
Goerisch diz que chegou a essa quantidade com base em levantamentos sobre a compra de ouro, a venda de combustível em Boa Vista e o pequeno movimento na zona de meretrício.
Responsabilidade
A delegada não tem documentos sobre esses levantamentos e fez essa investigação apesar de dizer que não tem orçamento e nem agentes suficientes para fazer a fiscalização da reserva.
Calcula que precisaria usar 10 dos seus 19 agentes para esse serviço. O posto da Polícia Federal em Surucucu foi desativado.
"Não me sinto responsável pelos índios. A Funai é a responsável. Fui chamada num sábado à tarde para resolver um problema entre aldeias. Tenho coisas mais importantes para fazer", disse Goerisch.

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