São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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Implementação do programa deixa dúvidas

CELSO PINTO
DO CONSELHO EDITORIAL

Existem três tipos de riscos envolvidos na quebra de um banco de porte: o risco para os que tinham dinheiro nele, o dos acionistas e o do mercado como um todo. Não há um modelo único no mundo para lidar com estes riscos, mas existe um razoável consenso sobre o que se deve evitar.
O Proer, o programa de ajuda à reestruturação dos bancos, é um inegável avanço em relação ao tratamento dado aos acionistas dos bancos. A forma como foi aplicado até agora, contudo, deixa dúvidas em relação aos outros dois pontos.
No passado, sempre que um banco quebrava, a tendência era eliminar os três riscos. O governo garantia o dinheiro aos depositantes, minimizava o risco sistêmico e os acionistas acabavam lucrando.
Nos anos 70, os controladores ganhavam porque o governo abençoava fusões e incorporações com generoso apoio oficial. Na década de 80, porque o sistema de liquidação corrigia os ativos, mas não os passivos. Com a alta taxa de inflação, em pouco tempo o buraco gerado pela quebra se transformava em saldo positivo. No final, o BC, conduzindo a liquidação, acabava sendo obrigado a pagar aos acionistas do banco quebrado.
O Proer criou um risco real aos controladores. O BC hoje tem poderes de tomar à força o controle de um banco com um buraco patrimonial ou que coloque o sistema em risco. Isso reduz o poder de barganha junto ao BC; no sistema anterior, o tamanho do banco e o temor do governo com a quebra abriam espaço aos controladores para negociar boas condições antes de abrir mão do seu banco.
Não há razão para proteger os acionistas da quebra de um banco ou de uma empresa. Comprar uma ação é um investimento de risco, que pode criar milionários ou miseráveis. Se as regras de fiscalização do BC são deficientes, ou se uma empresa de auditoria não soube ou não quis mostrar que o banco estava quebrando, minoritários têm o direito de processá-los. Absurdo é ratear a perda com contribuintes.
E os que investiram ou depositaram seu dinheiro no banco? O problema aí é menos do Proer do que da forma como ele foi aplicado. Desde a quebra do Nacional, o BC sinalizou que bancaria todos os depósitos e investimentos, em nome de minimizar o risco bancário.
Tratar pequenos depositantes pouco informados da mesma forma que grandes investidores sofisticados, é premiar a especulação e distorcer o mercado. O presidente do BC, Gustavo Loyola, admite este problema e diz que, com o fim do Proer, em dezembro deste ano, a garantia aos depositantes ficará limitada ao seguro até R$ 20 mil.
O risco sistêmico é a questão mais delicada e com a resposta menos óbvia. Risco sistêmico significa a possibilidade de haver uma ampla corrida contra os bancos, que levaria a quebras em sucessão e à necessidade de se gastar muito dinheiro público para salvar o que restasse do sistema.
Julgar se a quebra de um banco embute um risco sistêmico é algo difícil de mensurar: só é possível saber com certeza quando a crise sistêmica, de fato, ocorre. Qualquer país, dos EUA ao Japão, colocado frente ao risco de uma crise sistêmica, procura evitá-la.
O problema, nesse caso, não é tomar medidas emergenciais para lidar com situações emergenciais. Errado é garantir ao sistema que bancos grandes não quebram nunca. Se não há risco, não há porque evitar aplicar a taxas mais altas em bancos em dificuldades. Outra vez, é uma forma de premiar a ineficiência e a especulação.

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