São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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'Independence...' é apocalíptico

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

Quando o enorme disco voador cobre uma grande cidade com sua sombra, no início de "Independence Day" (também chamado "ID-4"), ou pouco depois, quando seus raios tenebrosos explodem a Casa Branca, não é mais com ETs que estamos à volta: é com o juízo final.
E, se o conjunto desse filme mostra-se não raro enfadonho, essas imagens ficarão gravadas por sua eficácia apocalíptica. A literatura e o cinema fantásticos, setor extraterrestres, sempre projetaram nesses seres o pesadelo de um confronto com o desconhecido.
Existe certo conforto crítico ao absorver esse pesadelo a algo conhecido. A emissão radiofônica de "A Guerra dos Mundos", feita por Orson Welles no fim dos anos 30, mais o pânico que disseminou, pode ser assimilada ao nazismo.
Os filmes de invasão alienígena dos anos 50 foram sistematicamente vistos como metáfora de possíveis invasões comunistas.
Tudo isso é verdade, e o sucesso do gênero ocorre, sintomaticamente, em momentos de insegurança. Mas não é, com certeza, toda a verdade (tanto que os bons filmes resistem a uma visão pós-Guerra Fria).
O estranho, em "ID-4", é que seu sucesso -avassalador- ocorra num momento de estabilidade política mundial aparente.
Nesse sentido, "ID-4" constrói-se como um sintoma. Por trás da quietude, desde as primeiras imagens, existe o pressentimento de que o combate do homem com o desconhecido, com seu próprio medo, não se esgotou.
Desde que o mundo é mundo, discos voadores não são apenas objetos interespaciais. São portadores da dúvida atroz sobre nossa natureza (somos únicos no universo?).
Carregam tanto a dúvida sobre a imagem que criamos de Deus (à nossa imagem e semelhança), como a centelha de divindade (seriam os deuses astronautas?).

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