São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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Acaba fascínio da carreira de médico

LUCIANA BENATTI
DA REPORTAGEM LOCAL

A medicina é a carreira universitária que mais perdeu prestígio -pelo menos entre os setores mais escolarizados e de maior renda da população paulistana.
A pesquisa constatou que a aversão ao trabalho de médico se destaca entre as pessoas com nível superior (27%), segmento em que está empatada tecnicamente com a de lixeiro (26%).
"A medicina é uma profissão não tão atrativa para quem tem uma renda maior", analisa José Martins Filho, 52, reitor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e médico pediatra.
Baixos salários, ansiedade, estresse e angústia, inerentes à profissão, podem explicar a rejeição, diz. "A medicina não atrai quem quer status. Outras profissões pagam melhor e sem o estresse."
Uma pesquisa da Fiocruz sobre o perfil dos médicos no Brasil constatou que 79,63% consideram sua atividade desgastante, 83,40% têm mais de um emprego e, destes, 30,16% trabalham em três locais diferentes.
O médico Milton Glezer, 39, especialista em emergência, encaixa-se no perfil. "Os médicos precisam ter de dois a três empregos, no mínimo, para manter uma qualidade de vida média."
Além de atender em seu consultório, onde trabalha cerca de dez horas semanais, Glezer dá plantões nos PSs (prontos-socorros) dos hospitais das Clínicas (35 horas semanais) e Albert Einstein (24 horas por semana).
Trabalha ainda como médico-assistente na Fundação Faculdade de Medicina (mais 24 horas). Com as quatro atividades, recebe cerca de R$ 6.000.
"Antigamente o médico dava plantão nos primeiros anos de carreira. Hoje até se aposentar."
Na sua opinião, trabalhar no PS é uma atividade estressante. "É preciso tomar atitudes rápidas. Não dá tempo de solicitar várias opiniões e exames."
Apesar das dificuldades, ele se diz satisfeito. "Faz parte da minha escolha. É um ônus que pago pelo prazer que eu tenho."
A neurologista Maria Helena Pinto, 51, trabalha há 28 anos no Estado e há 25 na prefeitura. Ganha R$ 2.178 (40 horas/semana).
Diz que há dificuldades de todos os tipos. "O que não falta é problema." Falta de equipamentos e medicamentos são alguns.
"O médico não trabalha sozinho. Se suspeito de um aneurisma, tenho de pedir autorização para fazer exames, que são caros e muitas vezes negados."
"As pessoas rejeitam a profissão porque são mal atendidas e pensam que a culpa é do médico. Sou cara e voz de um serviço ruim, que funciona mal."
(LB)

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