São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
Próximo Texto | Índice

BANCOS EM MUTAÇÃO

O caderno sobre bancos que a Folha publica hoje revela um quadro que se poderia resumir numa palavra: mutação. O sistema bancário passa por ajustes que mudarão a própria natureza da atividade no país.
Esse é um processo que se verifica hoje também em outros países. E os motivos muitas vezes se superpõem: das mudanças tecnológicas que criam um fluxo de informações em tempo real à desregulamentação financeira, da transição de economias estatizadas para economias de mercado aos planos de estabilização, passando pela formação de blocos econômicos e pelo fim do padrão de desenvolvimento do pós-guerra.
Mas a dramaticidade da mutação brasileira está em primeiro plano. Ainda não se sabe exatamente quanto custará aos cofres públicos a operação de salvamento e saneamento do sistema bancário. O governo, se evitou o pior, deve ainda muito à sociedade em termos de esclarecimento sobre a sua intervenção na crise.
A mutação brasileira, em especial no setor privado, tem três vertentes principais: concentração, mudança de objetivos e desregulamentação.
A concentração é, por enquanto, a questão que mais recebe atenção do governo. O Proer procura ao mesmo tempo dar crédito e facilidades para que o sistema supere a condição de "overbanking" (excesso de bancos) criada pelo regime de alta inflação.
O fim da inflação e o arrocho creditício de 95 mudaram as condições de operação e o governo, além de tentar minorar os problemas de solvência, procura promover uma consolidação do sistema. Como resultado haverá menos bancos, mais fortes e provavelmente mais cautelosos.
Essa cautela é o maior obstáculo para a segunda grande mutação, que é a dos objetivos dos bancos.
Afinal, não basta que simplesmente haja menos bancos e mais saudáveis. É preciso que essas instituições cumpram sua função, que é a de ativar os circuitos de crédito à atividade produtiva, em vez de simplesmente orbitarem em torno do financiamento do déficit público, crescendo vegetativamente à sombra de operações de tesouraria com papéis públicos.
Finalmente, há uma terceira mutação, já em curso e bastante polêmica. Trata-se da desregulamentação, que inclui temas difíceis como a abertura do setor à concorrência estrangeira e a cobrança de tarifas pelos serviços.
Em especial no caso da cobrança de tarifas, deve prevalecer o princípio de que o mercado é o melhor juiz. Ao mesmo tempo, ainda é grande o número de praças onde há apenas um banco, muitas vezes estatal, que não enfrenta concorrência. Segundo dados do BC, uma autêntica competição nesse setor existe em apenas 39,3% dos municípios brasileiros. E são 1.526 os municípios que possuem apenas uma agência bancária.
A mutação está apenas começando. A destruição do velho, por enquanto, é a parte mais visível. Cabe ao governo mostrar-se atento, exercer a supervisão que comprovadamente falhou no passado e abrir-se ao debate amplo que a sociedade exige.

Próximo Texto: PREOCUPAÇÃO ELEITORAL
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.