São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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O lamentável mundo do crime

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Dizem que é o crack. Só isso explicaria tamanha brutalidade. Uma espécie de alucinação que leva os criminosos a atacar pessoas pacíficas, como ocorreu no duplo homicídio do bar de Moema, em São Paulo. Os jovens assassinados estavam se divertindo inocentemente e sem importunar ninguém. Não tiveram a menor reação. Nem pensaram em resistir. Morreram assim mesmo.
Uma ação firme das autoridades poderia ter evitado essa e tantas outras tragédias, dispensando a mobilização de leigos que, no desespero, organizaram o Reage São Paulo -a exemplo do que foi feito no Rio de Janeiro.
O fato de a cidade ser grande, desigual e congestionada não justifica essa escalada do crime. A Folha de 15/8 mostrou que os homicídios já se tornaram a principal causa de morte entre os jovens de 15 a 34 anos da capital de São Paulo. De cada 100 pessoas que morrem nessa faixa, 41 são assassinadas. É um número alarmante! Assustador! Intolerável!
As pesquisas mostram que, em todo o mundo, o crime está intimamente ligado à desigualdade. Esta pesa mais do que a pobreza. Nos países de alta desigualdade, como é o caso dos Estados Unidos, México e Brasil, a criminalidade é alta. Nos países mais homogêneos como a França, Itália e Japão, a criminalidade é pequena. Em Gana, país homogeneamente pobre, a criminalidade é baixíssima.
Mas a elevada desigualdade não justifica o nível de violência que hoje domina a cidade de São Paulo e muito menos a inércia da polícia. Outras cidades vêm conseguindo enormes vitórias no combate ao crime.
No curto período de 1994-95, Nova York, que também é desigual, reduziu a criminalidade em 25% -muito acima dos 2% conseguidos pelos Estados Unidos.
Como se chegou a esse resultado? Mágica? Nada disso. Foi apenas o trabalho dedicado do chefe da polícia, William J. Bratton, e dos seus 38 mil comandados -ajudados, é verdade, por uma rede de telefones celulares conectados com a central de controle.
Entre nós, o número de policiais e de celulares é expressivo. É pena que são usados nos lugares errados. Grande parte dos PMs está enredada no cipoal da burocracia governamental, e a maioria dos celulares é usada para tratar de negócios particulares dos funcionários -todos mantidos com os impostos dos contribuintes que agora se organizam para dizer: Reage São Paulo! Isso não está certo. E não pode continuar assim.
Já é hora de os nossos governantes reorientarem os recursos humanos e materiais para cortar a parcela do crime que pode ser estirpada pelas medidas policiais -sem parar de agir, é claro, nas suas causas sociais.
O que não dá para aceitar é que todo o crime seja fruto do desemprego, pobreza e sofrimento. Se assim fosse, a maioria dos brasileiros estaria há muito tempo nas águas da criminalidade.

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