São Paulo, segunda-feira, 26 de agosto de 1996
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Empregadores preferem as mulheres

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
DA REPORTAGEM LOCAL

As mulheres com nível superior passaram a ser o objeto do desejo do mercado de trabalho. Nos primeiros cinco meses do ano, as admissões foram 86% maiores do que as demissões de trabalhadoras com esse perfil, em todo o país.
No mesmo período, as contratações de homens que completaram a faculdade foi apenas 37% maior do que as demissões.
Quem concluir que isso significa diminuição do machismo nas empresas estará enganado.
Não se trata de diminuição de desigualdades, mas o contrário: as empresas têm preferido contratar trabalhadoras qualificadas porque elas ganham dois terços do que recebem os homens.
Em São Paulo, o salário médio de admissão das mulheres com nível superior é 66% do de um homem com a mesma escolaridade.
Salários aviltados
Entre janeiro e maio, a média salarial paga às contratadas com esse perfil foi de R$ 843,00. Para os homens, o valor era R$ 1.277,00.
Graças às demissões de quem ganha mais e à contratação de trabalhadoras qualificadas por salários aviltados, as empresas paulistanas conseguiram aumentar em 57% seus quadros de profissionais com nível superior e pagar só 35% a mais por isso. Os dados se referem à capital paulista, mas a tendência se repete em todo o país.
Para Lena Lavinas, pesquisadora do Ipea -instituto de pesquisa do Ministério do Planejamento-, o modo pelo qual as mulheres estão conseguindo ocupar espaço no mercado vai destruir uma tendência histórica que lhes era favorável.
"A diminuição do diferencial salarial entre os sexos vai se dar pela redução dos rendimentos dos homens e não pelo aumento dos salários das mulheres", explica.
Estudiosa das desigualdades de gênero, ela diz que havia uma tendência anterior de aproximação das médias salariais masculina e feminina no mercado formal. Mas era fruto da melhoria dos rendimentos das mulheres.
Os números indicam reversão desse movimento. A causa dessa nova tendência não é uma eventual vontade feminina de se empregar a qualquer custo, mas uma exigência imposta pelo mercado.
"Essa história de que a mulher ainda tem que dar provas de que é capaz faz com que se desvalorize o seu salário. Ela não acha que tem que provar nada, mas o mercado exige que ela prove", afirma.
As novas informações foram extraídas do Caged, do Ministério do Trabalho. Usando recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador, a Datamec desenvolveu um software capaz de cruzar todos os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados.
A Folha pesquisou essa base de dados -que refere-se aos empregados registrados, cerca de metade do mercado de trabalho brasileiro- e descobriu que a tendência é a mesma nos três principais setores da economia.
Serviço de mulher
As empresas do ramo de serviços -setor que engloba da lavanderia da esquina ao Bradesco- são as que mais contratam mulheres que completaram o 3º grau, tanto em termos relativos como absolutos.
Até maio, as admissões haviam sido duas vezes maior do que as demissões: 10.795 mulheres com nível superior contratadas contra 5.321 demitidas.
O setor de serviços absorveu menos homens com essa mesma escolaridade nesse período, 9.340, mas contratou-os por um salário em média R$ 565,00 maior do que o oferecido às mulheres.
Na indústria, a situação é ainda mais dramática. Mulheres com nível superior são o único tipo de empregado cujo número de contratações superou o de demissões entre janeiro e maio em São Paulo.
Foram admitidas 2.855 com um salário médio de R$ 1.385,00, e demitidas 2.625 que recebiam, em média, R$ 1.490,00. Ou seja: o setor aumentou seu gasto mensal em apenas R$ 43 mil para ter 230 profissionais qualificadas a mais.
É pouco para um segmento empresarial que, até maio, já havia conseguido reduzir seus gastos com pessoal em R$ 8 milhões a cada mês por meio de demissões.
Pergunta reveladora
O comércio é o setor paulistano onde é maior a diferença salarial. A remuneração oferecida às mulheres com nível superior contratadas entre janeiro e maio não passa de 59% do salário pago aos homens.
Não há indícios de que essa tendência vá mudar tão cedo. A própria Lena Lavinas tem uma uma história pessoal que ilustra isso.
Ao procurar uma empresa de "headhunters", foi entrevistada por uma mulher que lhe perguntou quanto ganhava. Respondeu e ouviu como resposta: "Você não acha que já ganha bem?".

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