São Paulo, sexta-feira, 30 de agosto de 1996
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Dossiê relata abuso de crianças em guerras

GILBERTO DIMENSTEIN
ENVIADO ESPECIAL A ESTOCOLMO

Incapazes de correr, meninas paralíticas foram estupradas por soldados em Angola, na África -muitas delas perderam o pé ou uma perna por detonarem minas encobertas pela terra.
O caso foi revelado ontem no mais completo dossiê já produzido sobre a violência sexual contra crianças durante guerras, envolvendo 12 países.
Entre eles Angola, Moçambique, Libéria, Croácia, Bósnia, Camboja e Colômbia; investigaram-se também os campos de refugiados no Zaire, que receberam fugitivos da guerra civil em Ruanda.
O levantamento foi preparado por várias entidades não-governamentais espalhadas pela Ásia, África, Europa e América Latina, além da ONU.
Em Ruanda, foi registrado que uma criança de apenas cinco anos foi estuprada por um soldado.
Os soldados preferem crianças porque imaginam que estariam, assim, evitando contrair Aids.
Segundo a investigação, o abuso sexual de meninos e meninas acompanham as guerras. A consequência é a disseminação de gravidez prematura, doenças venéreas e HIV, o vírus da Aids.
O efeito piscológico, segundo os estudiosos ouvidos, é devastador. Crises de depressão acompanhadas de perda da auto-estima. O resultado é que muitas meninas estupradas acabam entrando na prostituição.
Depois de reduzido o conflito, surge uma geração de adolescentes prostitutas na Bósnia, o que veio junto com o consumo de drogas e alcoolismo.
Na Croácia, meninas chegaram a ser torturadas e estupradas em público; algumas foram aprisionadas apenas para propósitos sexuais.
Estupros públicos foram constatados em vários países. Nas Filipinas, uma menina de 13 anos apanhou e foi estuprada por soldados na frente de suas irmãs e irmãos.
Na Colômbia, os militares perseguiam um guerrilheiro, mas não conseguiram pegá-lo. Em retaliação, estupraram sua noiva.
Há casos de soldados de Bósnia, Croácia, Geórgia e Ruanda que foram forçados a assistir a tortura e estupro da mãe ou irmã.
Foi constatado que assistir ao estupro de familiares provoca profundos desequilíbrios emocionais nas crianças. Um menino na Geórgia enlouqueceu e nunca mais conseguiu falar. Outro menino, também na Géorgia, suicidou-se com uma granada de mão.
O dossiê revela que, na Guatemala, os próprios comandantes das tropas determinavam que se buscassem mulheres e crianças, e as tropas eram autorizadas a se "divertir" -essa oferta era pagamento por bons serviços no campo de batalha.
Às vezes, a situação de guerra faz com que as famílias estimulem o relacionamento entre a filha e os soldados para garantir proteção. É o que se registrou na Colômbia, envolvendo meninas de 12 anos.
A ONU foi alvo do dossiê, com a acusações de que suas tropas de paz patrocinam prostituição infantil em Angola, Camboja, Croácia, Moçambique e Ruanda.

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