São Paulo, sexta-feira, 30 de agosto de 1996
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Menino Fidel pediu US$ 10 a Roosevelt

PATRICIA DECIA
ENVIADA ESPECIAL A WASHINGTON

Em 1940, o adolescente Fidel Castro escreveu uma carta com vários erros de inglês ao então presidente dos EUA, Franklin Delano Roosevelt, congratulando-o por sua reeleição e pedindo uma nota de dez dólares.
O documento (veja fac-símile ao lado) foi encontrado pelo jornalista norte-americano Henry Raymont, e fará parte de seu livro "Troubled Neighbors: US-Latin American Relations from FDR to Clinton" (vizinhos conturbados: relações EUA-América Latina de FDR a Clinton), que será publicado em dezembro nos EUA.
O governo de Roosevelt, na opinião de Raymont, foi a época de ouro das relações entre EUA e América Latina, nunca mais reinstaurada após a Guerra Fria.
Ele afirma que é um mito acreditar que a política da boa vizinhança, praticada pelos Estados Unidos no período, tinha o simples objetivo de afastar os países latino-americanos do nazi-fascismo.
"Não acredito em determinismo histórico. Para mim, os homens que estão no poder têm muita influência no que acontece, e Roosevelt era discípulo de um diplomata muito preocupado com a América Latina, Josephus Daniels", diz.
Baía dos Porcos
Correspondente da agência de notícias "United Press International" em Havana, Raymont foi o primeiro a noticiar a invasão da baía dos Porcos pelos norte-americanos, em abril de 1961.
Por ter tido acesso a informação confidencial, foi preso e acusado de ser um agente da CIA (agência de inteligência norte-americana).
O jornalista foi solto após pedido de clemência e levado para a embaixada do Brasil pelo então embaixador Vasco Leitão da Cunha.
Raymont ainda foi o primeiro a fazer uma entrevista exclusiva com Fidel após a tomada de poder, também na embaixada brasileira.
"Após 24 anos da minha prisão, resolvi voltar a Cuba. Afinal, achei que era hora e, depois, tive uma relação especial com Fidel", diz.
Nesse reencontro, o presidente cubano reconheceu a acusação injusta ao jornalista. Na época, Raymont ainda não tinha encontrado a carta de Fidel. "Não reivindico a descoberta. Estava tudo nos arquivos, mas, infelizmente, ninguém teve interesse em pesquisá-los."
Uma citação anterior à carta aparece no livro "Fidel: A Critical Portrait" (Fidel: um retrato crítico), de Tad Szulc, com incorreções. "Ele diz que Fidel critica o nazismo e pede uma nota de vinte dólares. Acho que o autor não chegou a ver a carta", diz Raymont.
Outra curiosidade é que, apesar de afirmar textualmente ter 12 anos, o presidente cubano teria completado 14 anos em 1940, data do manuscrito. Fidel Castro nasceu em 1926 e acaba de comemorar o 70º aniversário.
No livro, financiado pela organização Twentieth Century Fund, Raymont diz que irá destacar o trabalho de Juscelino Kubitschek.
Segundo ele, JK foi o responsável pela melhor iniciativa de reaproximação dos EUA com a América Latina, propondo uma série de pontos em 1958. "Esse foi um momento perdido da história. O problema é que era o governo Eisenhower, e eles fizeram a melhor coisa para brecar qualquer iniciativa: instalaram um comitê", diz.
O jornalista, que esteve no Brasil na última semana entrevistando o presidente Fernando Henrique Cardoso, afirma que a Cúpula das Américas, realizada em fevereiro em Miami, pode ser o início de uma nova política no hemisfério.
"Se Clinton for reeleito, caberá aos presidentes Fernando Henrique Cardoso, Ernesto Zedillo (México) e Juan María Sanguinetti (Uruguai) costurarem a reaproximação com os EUA", afirmou.

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