São Paulo, segunda-feira, 9 de setembro de 1996
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Lou Reed e a voz da experiência

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

"No rock'n'roll, a diferença de idade entre artista e platéia não é grande. Mas, infelizmente, as pessoas na quarta fila imaginam que aqueles em cima do palco saibam de coisas que elas não sabem. E isso não é verdade."
As frases acima são de Lou Reed, escritas em 1970 na revista americana "ZigZag".
Obviamente, não valem mais nada. Pelo menos no show que Reed deu sexta-feira passada no Rio, a diferença de idade entre ele e seu público era significativa. E Lou não pareceu nada desconfortável no papel de alguém que sabe muito mais do que seus admiradores.
O que é absolutamente OK, porque verdade.
*
"Quando os Rolling Stones apareceram, logo gostamos deles. Eles faziam a mesma coisa que nós, só que melhor."
Essa é do Sterling Morrison, o baixista do Velvet.
A comparação com os Stones continua apropriada, claro. Só que agora quem leva vantagem é Lou Reed. Ao contrário de Mick Jagger e seus companheiros, Lou tem coragem de parecer velho, feio, de não bajular platéias, de tocar versões ultra-simplificadas de suas canções clássicas.
*
"A música moderna começa com o Velvet, e a influência e as implicações do que eles fizeram vai durar para sempre... A única coisa errada... seria romantizá-los demais."
Legal ver que essa análise, feita pelo crítico americano Lester Bangs ainda nos anos 70, permanece atual.
Na uma hora e meia de show, Lou Reed, embora não diga uma palavra entre as canções, parece o tempo todo jogar na nossa cara que "olha, eu vivi de monte, vi um monte de coisas, fiz um monte de coisas, mas isso aqui em cima é só uma banda de rock and roll, OK? E isso não quer dizer grande coisa".
*
Quer dizer... nem sempre. Algumas canções mais recentes dele entram numa discurseira dura de aguentar.
Uma vez li uma crítica contra um de meus escritores favoritos, o americano Jim Harrison, em que o resenhista acusava seus livros de parecerem "cartas que a gente gostaria que tivessem sido escritas para outra pessoa".
Deu para entender?
*
Seus gritos vêm de algum ponto distante, não se dirigem a ninguém, ecoam no vazio, procuram significados.
E às vezes acham. Mas só por uma noite.

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