São Paulo, sábado, 14 de setembro de 1996
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Fortes e fracos diante da globalização

NEWTON CAVALIERI

A internacionalização da economia, à luz do conceito de neoliberalismo, como processo histórico que remonta ao século 19, ainda se encontra esgotando seus diversos estágios. Como as anteriores, as etapas do momento também suscitam inúmeras interrogações e levantam as mais acesas discussões.
Coroando essa diversidade de conceitos e interpretações, praticamente unânime apenas no ponto em que a tendência é aceita como irreversível, há que se considerar também como verdadeira a constatação de que essa corrida pela globalização não encontra as diferentes nações no mesmo estágio de desenvolvimento e em idênticas capacidades produtiva e geradora de riquezas.
O Brasil, por exemplo, tem contrastes que outros países não possuem, assim como riquezas e potencial inexistentes em outros lugares.
Ignorar essas diferenças é quase, em nosso entender, imaginar uma espécie de pós-comunismo apenas fundamentado em bases produtivas diferentes, ou seja, o dinheiro, se é que isso pode existir.
Também os diversos setores da atividade humana têm peculiaridades que os distinguem dos outros, e não é difícil perceber como a globalização financeira agigantou-se, enquanto setores como o da construção pesada sentem amarras que ainda não puderam ser rompidas.
No nosso caso, em particular, pode-se afirmar, sem margem de erro, que a unilateralidade dos contratos que disciplinam a atividade está no centro do problema.
É impossível a determinado segmento da economia procurar expansão, principalmente globalização, quando depende apenas da boa vontade política deste ou daquele governante para que medições referentes a obras e serviços executados se realizem e sejam pagas em dia.
Como atrair parceiros internacionais para empreendimentos que poderiam dar nova fisionomia ao Brasil, inclusive no campo social, se dependemos todos desses laços que nos impedem a caminhada? Nas privatizações, o consórcio entre brasileiros e estrangeiros é uma excelente opção, geralmente estrangulada e abortada por desconfianças sobre a estabilidade das regras propostas.
Mais do que nunca se faz necessária a fixação de salvaguardas para que, ao menos em nosso setor, a tendência à globalização frutifique. Há outros menos expostos a essas agruras, como grandes conglomerados financeiro-industriais, que têm fácil acesso ao crédito externo, favorecendo seu desenvolvimento, já que nesse caso determinantes e coordenadas dos negócios são conhecidas e estáveis.
Para buscar a globalização, é necessário que o governo aja nos setores mais expostos, de forma a compensar, ao menos nesse primeiro instante, as evidentes diferenças existentes.
Importante, ainda, não deixar de ter em mente que a construção é o setor que mais emprega mão-de-obra não-especializada depois da agricultura, enquanto os grandes conglomerados perseguem como meta o corte de funcionários, o enxugamento da máquina e a própria tecnologia colabora para afastar o homem e dar lugar ao robô.
É evidente que em tudo isso está embutido um componente perverso -qual seja, a preterição do ser humano em favor de sistemas, que podem parecer irreversíveis, mas não são monolíticos e inaperfeiçoáveis.
É nessa compreensão do que deve ser mudado para que o Brasil não perca o rumo na atual etapa de globalização que se encontra a verdadeira virtude, tanto de governantes quanto de governados.

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