São Paulo, quarta-feira, 18 de setembro de 1996
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Os mansos herdarão a terra

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Já disse e repito: aprecio os candidatos que se apresentam no Programa Eleitoral Gratuito. Gosto sobretudo daqueles que afirmam com humildade e orgulho: "Vocês já me conhecem! Conto com o seu voto!".
Como cidadão de poucas e suficientes relações, não conheço esses candidatos, mas dou de barato que sou a exceção, eles devem ser conhecidos por suas virtudes e feitos.
Pelo menos, devem ser melhores do que aqueles que eu conheço e que não contam com o meu voto -que por sinal nada vale. Mesmo assim, prefiro votar nesses desconhecidos que outros conhecem e que devem ser excelentes. Como o tempo de que dispõem é escasso, a mensagem deles não vai além desse "vocês já me conhecem".
Fico imaginando como são e o que já fizeram. Em geral, são líderes de pequenas comunidades e de segmentos do mercado de trabalho. Um deles se diz representante dos "injustiçados das baterias das escolas de samba" -e taí uma classe que eu julgava imune às injustiças de que a vida é cheia.
Afinal, quando uma bateria passa pelo sambódromo, os locutores que transmitem o evento saúdam os integrantes com uma retórica altaneira, as 11 mil virgens desfilando na Sapucaí, os exércitos napoleônicos vindos de Marengo ou de Austerlitz não receberiam exaltação igual.
No entanto, são injustiçados, sei lá como ou por quem. Professores e lavradores, esses não me surpreendem. São realmente injustiçados, não preciso conhecê-los para saber como estão desamparados.
Outro dia, uma candidata de um dos municípios da Grande Rio declarou que tivera o útero perfurado ao fazer aborto num hospital da rede pública. Em sinal de protesto, ela ia à luta e confiava na vitória. Outro que confia na vitória é o cidadão que viu um disco voador em Cachoeiras de Macacu. Não conheço essa gente, mas gostaria de votar em todos.

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