São Paulo, segunda-feira, 23 de setembro de 1996
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Campanha não garante vitória

NEY FIGUEIREDO

A matéria da Folha publicada esta semana sobre o "guru" de Maluf, Duda Mendonça, abre um novo ângulo para discutir-se a real influência da propaganda política, principalmente do programa da TV, no resultado das eleições.
A propaganda, seja de um produto ou de um candidato, está no fim da linha de um longo processo de marketing. Quando este não é bem-feito, não existe apelo publicitário que vá funcionar.
O objetivo de um anúncio não é ganhar prêmios, mas sim vender um produto, um serviço ou uma idéia.
O mesmo acontece na política.
Na campanha do plebiscito, por exemplo, o programa mais bonito foi o do parlamentarismo, porém o mais eficiente e que acabou vitorioso foi o do presidencialismo.
Em 90, na disputa pelo governo de São Paulo, o candidato Paulo Maluf teve o programa mais elogiado, comandado pelo talentoso publicitário Duda Mendonça, mas quem levou a melhor foi Luiz Antonio Fleury, com um programa competente, dirigido por Chico Santa Rita, o mesmo que comandou o programa do presidencialismo.
Se o candidato está bem posicionado na mente do eleitor e tem propostas concretas, o seu programa de TV pode até ser sofrível, que ele ganha a eleição.
O contrário nunca ocorre: um bom programa não elege um candidato mal posicionado na disputa.
Uma estratégia correta pode sobrepor-se a uma comunicação sofrível. Mas a estratégia errada vai revelar-se catastrófica, se for realçada por uma boa propaganda.
Ainda na campanha de 90, a que me referi acima, Duda Mendonça estava tão convencido de que o adversário de Maluf era Mário Covas, e não Fleury, que, em determinado momento, procurou aproveitar-se da grande popularidade do governador Quércia (na época ele era, juntamente com Tasso Jereissati e Álvaro Dias, um dos governadores mais bem avaliados do país) e colocou as suas obras no programa de Maluf com um carimbo "Esta Obra de Quércia vai Continuar".
Esse erro foi fatal, pois o eleitor pensou: se alguém tem de continuar a obra do Quércia é o seu candidato, Luiz Antonio Fleury, que acabou levando a eleição, embora 45 dias antes do pleito não tivesse mais que 6% das intenções de voto.
Há muito sensacionalismo ao apreciar-se a força da propaganda numa campanha eleitoral. Ela influencia, mas não obriga.
Fora um ou outro aventureiro, os pesquisadores sociais sérios, como Janis Fesbach, Berlo, Mayo, Hovland, Sponberg, têm a humildade científica de confessar sua ignorância na área de pesquisa da propaganda. As ambiguidades e contradições têm caracterizado suas descobertas, que não atingiram ainda um "status" científico.
Uma corrente da psicologia, por exemplo, diz que os apelos emocionais baseados no medo, empregados no processo de persuasão, são negativos, ao passo que outra corrente conclui exatamente o contrário.
Os exemplos poderiam tomar páginas e páginas. Há não muito tempo a Unesco colocava em dúvida se a campanha contra drogas era nociva ou benéfica. Anúncios "preventivos", sobre sexo na Grã-Bretanha e alcoolismo na Suécia, parecem ter contribuído mais para popularizar esses "produtos" do que para melhorar o equilíbrio entre o uso e o abuso.
Inúmeros exemplos colhidos no dia-a-dia têm demonstrado que o eleitor dificilmente aceita o que contraria seus processos de projeção, identificação e intelecção. Isso não quer dizer que não possa ser influenciado, mas não existe uma ação unilateral da propaganda sobre ele.
Em meio do muito que se desconhece da natureza humana, o mínimo que um profissional bem informado pode afirmar é que os efeitos de uma determinada mensagem sobre o consumidor nem sempre estão na razão direta do desejo daquele que comunica, nem com o conteúdo da própria mensagem. As condições peculiares do eleitor podem bloquear, alterar ou até mesmo provocar um efeito diametralmente oposto ao pretendido.
No caso da campanha do Celso Pitta, em São Paulo, o que existe é o desejo do eleitor em votar na continuidade administrativa. Para ele, pelo menos até agora não se conseguiu demonstrar o contrário; Maluf foi bom prefeito, e, mais importante ainda, soube comunicar-se bem com o paulistano durante o seu mandato.
Não foi à toa que ele gastou, segundo a imprensa, cinco vezes mais em publicidade do que a Erundina, quando prefeita.
Como disse o Duda na citada matéria, não existe mágica em campanha política. É só ver as coisas como elas realmente são. Sem fantasias.
Ele, como qualquer outro bom profissional, ganha as eleições possíveis, elegendo o candidato com o perfil que o povo deseja, em determinado momento.

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