São Paulo, segunda-feira, 23 de setembro de 1996
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A Vale e você

DARCY RIBEIRO

Tenho hoje, para meus leitores, três informações sobre as quais precisamos meditar nesta avalanche de privatizações que nos afunda. Esse tema divide a nação numa minoria insignificante, formada pelos que estão contentes com o Brasil tal qual é; e a maioria, dos inconformados e descontentes. Os primeiros querem privatizar tudo que o Estado ainda detém. A maioria se pergunta: quem lucra com o que está sucedendo? Para ela, só cabe o desemprego e a penúria. Desgraçadamente, aquela minoria domina a mídia, que faz parecer unânime o apoio às privatizações. O pior é que domina suficientes parlamentares e executivos para viabilizar seus planos de apropriação do Brasil.
A primeira informação que tenho para você é a explanação de Francisco Schettino, presidente da Vale do Rio Doce, diante da Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados. Leia suas palavras:
"Podemos definir a Vale como uma empresa que trabalha com recursos naturais e logística de transporte. Opera em nove Estados, diretamente ou através de suas 14 empresas controladas e 26 coligadas. Os negócios a que esse conglomerado se dedica são: exploração de minério de ferro, manganês, ouro, bauxita e caulim; operação dos sistemas interligados mina-ferrovia-porto, no Pará, no Maranhão, em Minas e no Espírito Santo; navegação transoceânica; atividades nas áreas de peletização, siderurgia, ferro-liga e alumínio; manejo de maciços florestais para produção de madeira, celulose e papel. Cada atividade complementa outra, garantindo a sinergia entre os negócios do grupo. Para construir esse sistema, a Vale vem firmando parcerias de sucesso com investidores brasileiros, japoneses, italianos, espanhóis, franceses, sul-africanos e argentinos. A Vale é uma empresa de capital aberto, consagrada no mercado por sua transparência: 51% das suas ações pertencem à União e 49% já estão nas mãos de acionistas privados."
Que dúvida pode haver, para um homem público ou para um cidadão brasileiro consciente, de que a privatização da Vale é uma negociata que atenta contra os interesses nacionais?
A segunda informação é uma declaração do presidente do BNDES sobre a conveniência de privatizar a Vale. Veja seus argumentos: é uma usina integrada, líder no mercado brasileiro. É competitiva no mercado internacional. Não dá prejuízo. Tem um nível de atividade excelente -é moderna e atualizada tecnologicamente.
Essas razões desencontradas opõem os argumentos transparentes do servidor público que está à frente da Vale e as razões espúrias do presidente do BNDES. São antagônicas e irretorquíveis. Seria entre elas que o governo Fernando Henrique teria que optar, se já não tivesse optado.
E aqui vem minha terceira informação. É a de que, frente à oposição pública que a negociata provoca, estão apelando para o suborno. Querem criar um fundo com os dinheiros resultantes do leilão da Vale para ratear entre os Estados em que ela opera. Mas os Estados vizinhos não concordam. Querem também seu bocado. Tome posição você também.

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