São Paulo, quarta-feira, 25 de setembro de 1996
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Líder precisa ter sinceridade e coerência

BILL GATES

Para a maioria das pessoas, o grande líder é uma pessoa capaz de fazer discursos que empolgam e motivam seus comandados.
Não há dúvida alguma de que a capacidade de inspirar e motivar é importante.
Um líder precisa ter tanto uma visão quanto a capacidade de transmiti-la às pessoas.
Mas, para ter êxito a longo prazo, o líder precisa ser franco com seus funcionários, tanto ao falar dos desafios que eles enfrentam quanto ao apresentar as oportunidades que lhes são oferecidas.
Um estilo de liderança empolgante não funciona se o líder transmitir sinais contraditórios.
Mensagem dupla
Se você anima seus vendedores em uma reunião, dizendo a eles que "a meta mais importante é satisfazer os clientes", não pode voltar no dia seguinte e dizer: "Sua cota acaba de ser dobrada, portanto saia e venda o dobro de sua quantidade anterior".
Se você transmitir esse tipo de mensagem dupla, seus vendedores saberão que aquele papo todo sobre satisfazer o cliente não passava de papo e que a verdadeira prioridade continua sendo conseguir uma cota mais alta.
Um líder efetivo também precisa reconhecer que o sistema de recompensas de uma empresa deve reforçar sua mensagem, não solapá-la.
Quando eu me preparava para abrir o capital de minha empresa ao público em geral, tomei medidas para distribuir uma parcela substancial de ações aos funcionários. Era uma maneira de mostrar a eles o quanto seu desempenho era importante para a empresa.
Como as mensagens transmitidas precisam ser honestas, o líder não deve prometer recompensas que não poderá conceder, nem fazer elogios que não sejam sinceros.
Eu tomo muito cuidado em relação ao que prometo a meus funcionários. Não exagero nos elogios: quando faço um elogio, quero que seja genuíno, que tenha significado para aquele funcionário.
Mudanças
O outro lado da moeda, quando se trata de recompensar funcionários por seu desempenho, é que é preciso assegurar que os empregados que não contribuem para a empresa sejam gerenciados com cuidado ou transferidos.
Os funcionários precisam perceber que seus pares são realmente bons e que, se alguém não estiver cumprindo seu papel na empresa, alguma mudança será feita.
Se as mudanças apropriadas não forem realizadas, a mensagem transmitida será ambígua: "A diretoria diz que quer desempenho máximo de todos, mas tolera um desempenho não tão bom".
Alguns líderes que se mostram brilhantes quando se trata de motivar os funcionários no curto prazo não funcionam tão bem a longo prazo, porque não são totalmente francos.
Um líder industrial muito conhecido conseguiu fazer com que seus empregados empreendessem esforços quase sobre-humanos durante meses a fio, prometendo que o projeto da empresa seria um sucesso retumbante.
Mas, depois que o produto foi lançado no mercado, sua equipe ficou desiludida. Seus integrantes perceberam que não poderiam continuar trabalhando naquele ritmo frenético para sempre e que as promessas gloriosas do dirigente eram exageradas.
Alguns líderes funcionam bem tanto a curto quanto a longo prazo, mas são poucos.
A reviravolta promovida por Eckhard Pfeiffer na Compaq Computer a partir de 1991 foi uma obra-prima de liderança.
Ela me pegou de surpresa, porque eu não imaginava que Pfeiffer, que acabava de ser promovido ao cargo de executivo-chefe, pudesse produzir transformações tão fundamentais em sua companhia em tão pouco tempo.
A Compaq foi fundada em 1983 por engenheiros que descobriram como fabricar clones do computador pessoal original, feito pela IBM.
A empresa conseguiu vendas extraordinárias praticamente desde o início e fortaleceu sua reputação ainda mais quando conseguiu colocar no mercado, antes da IBM, o primeiro PC construído com o chip 386.
A Compaq fabricava PCs de alta qualidade, a preços altos, e tinha uma margem de lucro cômoda, de mais ou menos 40%.
Mas em 1991 ela já enfrentava concorrência acirrada por parte de empresas inteligentes como a Dell Computer, uma companhia que vendia computadores no varejo por encomenda postal e era dirigida por Michael Dell, um inovador esperto cuja empresa estava se saindo muito bem, com margem de lucro de apenas 25%, mais ou menos.
Depois que a Compaq sofreu perdas financeiras e queda em sua participação no mercado durante vários trimestres, seu conselho de direção promoveu Pfeiffer ao cargo de presidente e executivo-chefe, em outubro de 1991, encarregando-o de reduzir os custos da empresa dramaticamente.
Seu trabalho seria o de salvar a empresa, remodelando-a de alto a baixo.
Muitas pessoas se mostraram céticas, mas as dúvidas não duraram muito tempo.
Longo prazo
Pfeiffer começou por enxugar os gastos desnecessários e penetrar no mercado de PCs mais baratos, com uma máquina cujo modelo básico era vendido a apenas US$ 899.
Enquanto os preços caíam, o faturamento da Compaq subia, e em pouco tempo a empresa estava voltando a lucrar, com margens de aproximadamente 25%.
Pfeiffer tinha uma perspectiva de longo prazo. Ele incrementou os setores de pesquisa e desenvolvimento.
Começou a operar as fábricas da Compaq 24 horas por dia, sete dias por semana, em lugar de trabalhar com 40% da capacidade delas, como era feito antes.
Não é fácil mudar o rumo de uma grande empresa, porque para isso é preciso convencer todos do que se pretende.
Pfeiffer disse certa vez que, quando assumiu o controle da Compaq, seu objetivo principal era comunicar a seus funcionários "uma mensagem única, clara e inequívoca".
Lição séria
Pfeiffer, que havia conquistado respeito na Compaq devido ao sucesso que tivera anteriormente na direção das operações européias da empresa, disse a seus funcionários que, se a empresa não mudasse radicalmente, ela teria que fechar. Era verdade, e eles acreditaram.
A Compaq se tornou uma empresa diferente, aparentemente da noite para o dia. Continua sendo uma das mais importantes no mercado dos computadores e está bem posicionada para o futuro.
A coerência e franqueza de Pfeiffer na direção deitaram as bases para o sucesso atual da Compaq.
E representam uma lição muito concreta para outros dirigentes.

Cartas para Bill Gates, datilografadas em inglês, devem ser enviadas à Folha, caderno Informática -al. Barão de Limeira, 425, 4º andar, CEP 01202-900, São Paulo, SP- ou pelo fax (011) 223-1644. A correspondência pode ser enviada ao endereço eletrônico askbill@microsoft.com.

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