São Paulo, quinta-feira, 26 de setembro de 1996 |
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Grotowski ensina teatro em SP
DO "LIBÉRATION" *Pergunta - Como o sr. trabalha atualmente? Jerzy Grotowski - São principalmente Thomas (Richards) e o grupo que trabalham. Eu aconselho, dou uma assistência. Não devo ser um grande demiurgo e sim mais um avô, para usar a expressão de Thomas. Senão os outros não poderão crescer plenamente. Trabalhamos com ações ligadas aos antigos cantos vibratórios, os cantos que no passado serviram a propósitos rituais e que, portanto, exercem um impacto direto sobre a cabeça, o coração e o corpo dos "atuantes". Cantos que fazem passar de uma energia vital a uma energia mais sutil. Eu usei muitas vezes a expressão "ritual laico", o que me fez passar entre o Estado ateu e a igreja polonesa -que era e continua sendo rígida. Precisei passar entre esses dois pólos sem que eles fossem contrários no mesmo momento. Foi por isso que inventei o "ritual laico". Pergunta - Já faz tempo que o sr. não assina espetáculos. Sua pesquisa continua, longe dos palcos. Tudo se passa como se a idéia de transmissão tivesse tomado o lugar do espetáculo. Grotowski - No Oriente, a transmissão não é interrompida. As pessoas não cospem em seus predecessores para se afirmar. Os tibetanos dizem que é preciso superar o mestre em um quinto, ou seja, 20%, senão a tradição se deteriora. Para mim, hoje, a questão da transmissão é fundamental. Pergunta - Será que ela pode se reduzir à transmissão livresca? Thomas trabalha com o sr., mas o sr. não trabalhou com Stanislavsky. O trabalho de transmissão oral não é insubstituível? Grotowski - O que garante a transmissão é o seguinte. Eu trabalhei com determinados velhos atores do Reduta (grupo de teatro polonês, anterior à Segunda Guerra) e com Zavadski (professor da escola de teatro de Moscou, nos anos 50), um colaborador estreito de Stanislavsky. Ao ler os textos de Stanislavsky e as descrições de seu modo de trabalhar, senti uma compreensão prática imediata. E quando eu procurava aplicar isso em meu trabalho, Zavadski, que observava, exclamou: "Mas Jerzy trabalha exatamente como Stanislavsky!" Além disso, há mais do que o teatro. Desde criança eu me interessava por diferentes tipos de técnicas "psicofísicas". Aos 9, meu primeiro ponto de orientação foram as grandes figuras das técnicas hindus. E foi esse primeiro centro de interesse -como a pessoa trabalha a si mesma com outra pessoa, no contexto performático- que me fez chegar ao teatro. Em toda a minha vida, sempre procurei pessoas que tivessem relação com esta ou aquela técnica ou tradição. E assim, em vários campos, recebi uma transmissão direta. Pergunta - O sr. não teme que seu trabalho seja desviado depois da sua morte? Grotowski - A transmissão é quando é. Querer controlá-la, até mesmo a partir do túmulo, é querer prolongar a nossa própria vida, artificialmente. Eu vou morrer fisicamente e... não. Pessoas inteligentes, como Krishnamurti, caíram nessa fraqueza, no final de suas vidas. LEIA a continuação da entrevista com Grotowski à pág. 4-3 Texto Anterior: Grotowski ensina teatro em SP Próximo Texto: Coluna Joyce Pascowitch Índice |
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