São Paulo, sexta-feira, 27 de setembro de 1996
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Poeira nos olhos

JOSÉ ANTONIO DE FREITAS

O ministro da Administração, Luiz Carlos Bresser Pereira, vem, por meio de artigo na Folha (16/9), participar de forma totalmente equivocada do desesperado esforço do alto comando do PSDB para, em vão, tentar salvar a naufragada candidatura tucana. Equivocada porque quem integrou o governo, na condição de ministro da Fazenda, e legou ao país a maior inflação da história da República não tem autoridade para escrever sobre déficit público.
Sempre que um técnico quer jogar poeira nos olhos da sociedade, tentando confundir quando não consegue convencer ou explicar, refugia-se no jargão dialetal inacessível aos comuns mortais, o déficit público.
Quando Paulo Maluf assumiu a prefeitura, em janeiro de 93, o déficit orçamentário era de 18%, com um déficit corrente de R$ 421 milhões, expressos no balanço de 1992. O que quer dizer isso? Quer dizer o seguinte: somando tudo o que a prefeitura recebeu, sua receita corrente, isto é, os impostos e taxas municipais, as transferências do Estado e da União, não deu para pagar as despesas correntes, isto é, tudo o que a prefeitura tinha obrigatoriamente que gastar com a manutenção e operação da cidade -o pagamento dos funcionários, a coleta de lixo, a conservação das áreas verdes etc.
Em outras palavras, em 1992 a prefeitura gastou R$ 421 milhões (valor atualizado) além do que arrecadou. Isto que era, claramente, déficit público. Quer dizer, a prefeitura não tinha um real sequer para investir ou que lhe servisse de lastro para contrair empréstimos. Ou seja, gastava mais do que arrecadava, devia e não tinha "capacidade de pagamento" e, em consequência, não tinha crédito na praça ou "capacidade de endividamento".
O que fez a administração Maluf, com a sua competente experiência empresarial? Não é aquela do ministro Bresser Pereira, que, há um ano e nove meses no cargo, ainda não explicou à sociedade o que faz seu ministério nem o que seja a "reforma administrativa".
O competente secretário Celso Pitta, em vez de tentar reinventar a roda, com planos mirabolantes como o malfadado Plano Bresser, de triste memória, e suas esdrúxulas siglas do tipo URP, preferiu a saída da racionalidade, da transparência e do bom senso (coisa tão rara!) econômico: reduzir despesas e elevar receitas. Impôs um programa de contenção e racionalização do gasto público. Estancou o crescimento indiscriminado do quadro de pessoal. Elevou a receita tributária do município, que representa o "esforço próprio do município de gerar recursos", sem punir os contribuintes, já que não houve aumento de alíquotas dos tributos.
Assim, somente com a privatização da CMTC, a prefeitura deixou de transferir cerca de R$ 800 milhões por ano, a título de subsídio ao transporte coletivo e subvenção à empresa, para custear o inchaço da mesma, que tinha mais de 27 mil funcionários.
A política de "enxugar responsavelmente a máquina administrativa" possibilitou uma expressiva redução no quadro de pessoal ativo. Em dezembro de 1992, o Executivo tinha 141.148 servidores. Em julho passado, esse número caiu para 118.058, representando uma redução de mais de 16%. Do aperfeiçoamento da máquina arrecadadora decorreu um crescimento real da receita tributária de 87%, no triênio 94/96.
Como resultado dessa política austera, já em 1994, o déficit corrente de R$ 421 milhões tinha se revertido para um superávit de R$ 890 milhões. Em outras palavras, já em 94 a prefeitura não tinha -como hoje não tem- qualquer vestígio de déficit público, ou seja, gastava menos do que recebia e, com dinheiro em caixa, tanto podia investir como pedir dinheiro emprestado.
Foi essa saúde econômica e financeira que levou o Banco Central e o Senado a autorizar a prefeitura a emitir títulos para a rolagem de sua dívida mobiliária e para o pagamento de precatórios e, ainda, a contratação de empréstimos junto ao BID e à CEF para o Cingapura e para o Programa de Drenagem.
Agora vejamos outra poeira nos olhos que o senhor ministro tenta jogar: a questão da dívida da prefeitura. Em 31 de dezembro de 95, a dívida mobiliária, isto é, em títulos, da Prefeitura de São Paulo era de R$ 3,95 bilhões. Já em maio deste ano, sem que qualquer título fosse emitido, tinha saltado para R$ 4,40 bilhões, ou seja, 12% ou R$ 450 milhões a mais. Por quê? Por causa da política extorsiva de juros do governo federal que está levando todos os Estados brasileiros a não ter dinheiro este ano nem sequer para pagar o 13º salário dos funcionários.
Para entender a empulhação sobre a dívida municipal, basta citar gente que entende de economia de verdade, depondo em reportagem da Folha no mesmo dia 16/9: "A dívida de São Paulo é grande, mas não é demasiadamente grande quando comparada à dívida do governo federal e à do Estado. É preciso ter cuidado com a alta taxa de juros" (Álvaro Zini, professor de economia da USP). "São Paulo está melhor do que a maioria das cidades. O sucessor de Maluf não sofrerá como Covas, que está sem dinheiro. O setor público é como bicicleta: se parar, cai" (Paulo Yokota, ex-diretor do Banco Central).
Em resumo, é o representante do governo que deveria se preocupar e se ocupar em explicar à sociedade as elevadas taxas de desemprego, as altas taxas de juros e por que entregou a um único banco privado a bagatela de R$ 7 bilhões, mais que o orçamento anual da prefeitura. Isso vem se contrapor a uma gestão que gerou 100 mil novos empregos e legou à população soluções concretas para seus problemas mais agudos, como o plano PAS e o projeto Cingapura.
É muita poeira e, sobretudo, falta de informações ou má-fé sobre as finanças municipais.

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