São Paulo, segunda-feira, 30 de setembro de 1996
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Deixei meu coração em San Francisco

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Cheguei um dia atrasado para o show do Sebadoh. E por 48 horas perdi uma super-reunião de bandas da gravadora Estrus, como melhor do punk de garagem americana.
Se eu ficasse mais uma semana, dava para pegar o Helmet lançando seu novo disco. Os Butthole Surfers também vão estar na área, mas mais uma vez será tarde demais para mim.
Escrevo de San Francisco, onde, sem exagero, em uma semana a gente se vê exposto a mais informação do que em uma vida vegetando em São Paulo ou no Rio.
Perder todos esses shows de que falei acima não se deve a nenhum tipo especial de uruca. Acontece que por aqui é assim mesmo: bandas ótimas tocam em todos os cantos. Impossível ver tudo.
Ainda assim, no dia em que cheguei (sábado retrasado), já deu pra pegar uma de minhas bandas prediletas, o Overwhelming Colorfast, lançando o seu terceiro álbum.
Como eles são daqui mesmo, o show rolou em clima totalmente familiar. O próprio vocalista, o gordão Bob Reed, vendia CDs e camisetas, enquanto fazia social com a galera que compareceu ao pequeno clube Kilowatt.
O Overwhelming Colorfast não decepcionou: seu som já foi descrito como um encontro de Husker Du com os Beatles e não há platéia que não goste de um mix desses.
A surpresa ficou por conta da abertura: três moleques do Texas que se intitulam Mineral. O baixista arrebentou duas cordas, o guitarrista, uma, e o cara da bateria rachou uma baqueta no meio.
O som ainda vai demais na cola do Pavement, mas, com tanta vontade, dá para prever que o Mineral chega longe.
E o que mais? Bom, vi uma coisa bizarra chamada Smoking Popes que, juro, soa como os Smiths em versão hardcore. O vocalista é um gordo careca que canta de olho fechado com um sorriso doentio de orelha a orelha.
Quem abriu foram os Figgs, de quem eu nunca tinha ouvido falar e não fez feio com seu punk dissonante muito bem tocado.
E sabe quem apareceu por aqui? Os galeses do Manic Street Preachers, que andavam meio no limbo desde o desaparecimento do guitarrista Richard James Edwards (até hoje não se sabe se o figura está vivo ou morto). Os Maniacs arrebentam ao vivo. Claustrofóbicos, angustiados. Uma espécie de anti-Oasis.
Até eu voltar ainda deve ter mais coisa: os punks do Queers, os açougueiros da dance music industrial do Meat Beat Manifesto etc. etc. etc.
No mais... a Califórnia continua linda. Tatuagens são definitivamente coisa de fru-fru. A onda agora é ter cicatrizes. Isso mesmo: um estúdio de San Francisco, especializado em "alterações corporais", rasga a pele do cliente com bisturis, formando figuras geométricas. Depois, é só desinfetar e deixar que a natureza faça o resto. Cicatrizes por encomenda. Está bom, amiguinho(a)?

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