São Paulo, terça-feira, 7 de janeiro de 1997
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Tecno é promessa para 97 em São Paulo

CAMILO ROCHA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Tecno é promessa para 1997 em SP
O tecno tem tudo para estourar em 1997 em São Paulo. Pela primeira vez no país, gêneros da dance music underground saem do gueto em que residem há muitos anos e ameaçam se tornar um fenômeno de larga escala. Assim como já aconteceu em diversas partes do mundo, como Europa, Japão e Austrália.
Os sinais são muitos e vêm de várias partes. Grupos organizam raves (festas tecno ao ar livre) nos arredores de São Paulo, a produção musical nacional no gênero aumenta, clubes de diversos tipos e públicos dedicam noites ao gênero e cada vez mais gente que ouvia estilos como rock está se convertendo às batidas eletrônicas.
É bom esclarecer que a dance music de que se fala aqui nada tem a ver com o infame "poperô" que impregna as ondas do rádio e o som das casas comerciais.
Tecno e suas sub-variantes como trance, acid, trip hop e drum'n'bass são sons de caráter underground, experimentais e radicais na forma. Geralmente são instrumentais, muitas vezes sem melodia e de autoria de artistas obscuros. A produção é de custo baixo, feita em estúdios que cabem num quarto de uma casa.
Durante anos, alguns DJs e clubes já vêm tocando dance underground em São Paulo. Só que a coisa sempre esteve basicamente restrita ao chamado "mundinho". Isso agora está mudando, e rápido.
Entre os responsáveis por trazer novos adeptos ao tecno estão os grupos que organizam festas ao ar livre nos arredores de São Paulo, como Oribapu, Cuckooland e Psycodelic Underground.
Natureza
O Oribapu celebrará um ano de existência com uma festa dia 27 na praia de Itaguaré, em São Lourenço (para mais informações passar no Café Santa Clara, na rua Mateus Grow, 613).
Nesse meio tempo, sem praticamente nenhum apoio de mídia ou patrocínio, o grupo viu o público médio de suas festas crescer de cem para 600 pessoas.
"O ano que vem está prometendo. Tem cada vez mais gente nova nas festas, gente diferente, universitários, surfistas etc.", garante Eduardo Kuetze, 24, membro do Oripabu. "A idéia de fazer festas tecno em lugares com natureza atrai outros tipos de pessoas."
O Cuckooland é um projeto do DJ Dmitri, 31, brasileiro que morou nove anos na Europa, boa parte deles em Ibiza, onde tocou em casas como Space e Pacha.
Ele crê que "em 97 vai dar uma estourada. Antes, a maior parte do público tecno em São Paulo era ligada àquela coisa gay/clubber. Mas com as festas fora dos clubes o público heterossexual está vindo aos montes".
Liberdade
Mas se engana quem acha que as raves podem tirar público dos clubes ou que as cenas não se bicam. Segundo Maurício 'Pil' Marques, 23, promoter do Hell's Club, "as festas e os clubes se completam, uma não rouba público da outra".
Tanto que, a partir de janeiro, Pil começará a organizar suas próprias festas ao ar livre, embora continuará fazendo o Hell's.
A inspiração, segundo Pil, surgiu numa rave organizada pelo Oribapu na praia de Maresias alguns meses atrás. "Num lugar aberto rola uma energia especial, você pode dançar ou ir dar uma volta pela praia ou mato. Há mais liberdade para se expressar."
Outro tipo de público que está sendo atraído pelo tecno são os mauricinhos. Duas casas frequentadas por jovens de classe média alta para cima, o Floresta e o Kashmir, passaram a incluir noites de tecno na programação.
O Kashmir fechou com o DJ Mau Mau, do Hell's Club, para tocar toda terça. O Floresta dedica suas quintas ao tecno e já teve duas atrações internacionais na casa: o DJ Angelo e o grupo Acid Junkies, ambos de Amsterdã.
Periferia
Enquanto isso, em bairros distantes do eixo Jardins-Pinheiros-Vila Olímpia, vários clubes radicalizam na seleção de som. "Underground" é como são conhecidos esses sons na periferia.
A Tocco, na Vila Matilde, mantém há mais de um ano uma sala separada da pista principal onde reina o drum'n'bass do DJ Marky Mark. Outras casas, como a Sound Factory, na Penha, e a Popeorn, na Vila Maria, descarregam batidas pesadas na pista.
Lojas especializadas em tecno como Discomania e Mo'Better têm registrado um aumento de vendas e uma demanda crescente por CDs de música eletrônica.
"O leque vem sendo bastante ampliado. Muita gente que nunca foi a clubes está se interessando por esse tipo de som", confirma Antônio Junior, 28, gerente da Mo'Better. "As coisas psicodélicas, tipo trance e trip hop, são as que mais saem. Os mauricinhos adoram trance."
Intercâmbio
O crescimento da cena tem entusiasmado muitos DJs e festeiros a vir ao Brasil. Nada mais normal, afinal as cenas de tecno ao redor do mundo vivem em intercâmbio.
Sempre que se ouve falar de uma cena nova despontando, ravers de outros lugares começam a chegar ao "novo território", entusiasmados com as possibilidades.
O DJ Ujjain, 36, é um deles. Depois de morar mais de dez anos na Índia, fazendo festas em Goa e Puna, Ujjain se instalou no Brasil há um ano e já tocou seu "trance psicodélico" em inúmeras festas.
"Depois de muito tempo na Índia, onde a cena está consolidada, gosto do fato de estar num lugar onde o tecno é um fenômeno novo", explica. "As pessoas são mais entusiasmadas, têm a energia de estar descobrindo algo."
"Ouvi dizer que a cena em São Paulo está crescendo, e como é um lugar legal para tirar férias, resolvi vir. Achei demais até agora. Fui numa festa na USP que foi tão boa e nervosa quanto as de Londres."
Neste verão a cena tecno de São Paulo se transfere em massa para Arraial D'Ajuda e Trancoso, na Bahia. Nesses lugares rolam raves há uns quatro anos, basicamente frequentadas por estrangeiros.
Este ano, os brasileiros devem chegar em peso no local para se juntar às festas. "A Bahia deve pegar com tudo esse verão, muita gente da Europa também está vindo", diz Dmitri. "Isso deverá dar um empurrão legal para a cena em São Paulo, lá por março e abril."

ONDE: Mo'Better - rua Nazaré Paulista, 438, tel. 011/62-1008
Discomania - rua 24 de Maio, 116 rua alta, tel. 011/221-0836
Floresta - rua Funchal, 500, tel. 011/8200-9235
Hell's Club - rua Estados Unidos, 1.570, tel. 011/3064-3380
Kashmir - rua Fiandeiras, 697, tel. 011/820-0113
Informações sobre festas do Oribapu, Chuckooland e Psycodelic Underground podem se conseguidas na Mo'Better e nas lojas da Galeria Ouro Fino, rua Augusta, 2.690.

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