São Paulo, sábado, 11 de janeiro de 1997
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Nepotismo e greve

WALTER CENEVIVA

Nepotismo e greve foram palavras frequentes no fim de 1996 e neste começo de 1997, em temas do Poder Judiciário, com vozes a favor da greve e do nepotismo, partidas da magistratura.
Voltando ao começo: não sei de estatísticas ou pesquisas sobre o que pensam do nepotismo e da greve os magistrados brasileiros, dos tribunais superiores, dos regionais federais, da Justiça do Trabalho, da Militar e dos Estados e Distrito Federal.
Creio, porém, que a greve terá boa acolhida entre os jovens juízes, com menos de dez anos de carreira, e as críticas ao nepotismo interessarão precipuamente aos mais antigos, únicos com poder para praticá-lo.
As manifestações em prol do nepotismo (sob desculpa de independência do Judiciário) e de greve (sob o argumento de salários melhores) estão erradas, mesmo sem discutir o mérito do debate.
Seja qual for o resultado obtido por essas manifestações, a magistratura sairá mal ferida. Mal ferida porque o juiz deve ser, por natureza, contra o nepotismo, o estranho vocábulo que saiu da igreja para ferretear a proteção indevida dos parentes, em detrimento de estranhos, ainda que mais qualificados.
De outro modo, quando os juízes defendem a relevância de suas importantes funções -e têm carradas de razão- dizem que são servidores diferenciados do Estado, não confundíveis com os funcionários públicos em geral e, portanto, não atingíveis pelas mesmas regras aplicáveis a esses, até pelo diferente tratamento constitucional que recebem.
Ora, se os juízes, negando justiça ao povo, puderem fazer a greve autorizada pelo artigo 37 da Constituição, como os outros servidores públicos, devem, por elementar respeito ético, assumir os mesmos encargos destes.
Não podem e não devem querer o benefício sem os ônus correspondentes. É razão mais que suficiente para que não façam greve, como José Renato Nalini, juiz em São Paulo, sustentou em lúcido pronunciamento recente.
De outro modo, defender a independência do Judiciário para afirmar sua liberdade na nomeação de parentes é quase loucura.
Disse bem José Paulo Sepúlveda Pertence, presidente do Supremo Tribunal Federal, que o dever do Judiciário aponta a favor de leis que vedem o nepotismo.
Nos dois assuntos o magistrado brasileiro está na encruzilhada de decidir sobre a diferença entre ser juiz e estar juiz, com cuidado suficiente na avaliação, para conseguir preservar sua condição de último fiador da paz social.

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