São Paulo, sábado, 11 de janeiro de 1997
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CREDIBILIDADE EXTERNA

As justificativas apresentadas pelo governo para certos desequilíbrios associados ao Plano Real têm variado. Ao longo do tempo, entretanto, com a insistência dos críticos no tema da valorização cambial e das novas formas de dependência externa, o governo passou a concentrar suas explicações nas contas externas.
Entre os argumentos mais usados está o que diferencia os capitais "bons" dos "ruins". O capital bom seria o que vem por meio de investimentos no setor produtivo, gera emprego, tem horizonte de longo prazo. O ruim seria o que busca apenas ganhar a diferença entre juros internos e externos, tem horizonte de curtíssimo prazo e, se gera emprego, é no setor financeiro.
O governo chama a atenção para a saída de capitais "voláteis", especulativos, com a simultânea substituição por investimentos diretos. O déficit comercial não seria um problema grave, pois está associado a um fluxo positivo de capitais cujo horizonte é de longo prazo. Mas é preciso destilar a retórica da realidade para que a verdade fique mais próxima.
Estudos do Fundo Monetário Internacional com base na dinâmica das contas externas de vários países em desenvolvimento alertam para o perigo dessa ilusão. O capital financeiro e o capital produtivo já não existem de forma pura, cada qual confinado em seu "território".
Entre outros resultados, o FMI revela que os fluxos de investimento direto podem obedecer a padrões cíclicos, "fugindo" de um país ou afetando suas contas externas de modo tão dramático quanto uma aposta puramente especulativa no mercado cambial de curtíssimo prazo.
As contas externas são apenas uma das equações macroeconômicas. É inútil -e conceitualmente equivocado- querer encontrar o equilíbrio buscando movimentos mutuamente compensatórios entre as várias modalidades de capital, entre os "bons" e os "ruins". Principalmente porque os estudos empíricos mostram que nem sempre as "volatilidades" se compensam.
A credibilidade dos credores externos (investidores de todas as modalidades) é um fenômeno crucial, mas que não se compreende olhando apenas o nível de reservas ou imaginando um processo harmônico e contínuo de substituição de capital "ruim" por capital "bom".
A credibilidade externa depende sobretudo do devedor saber mostrar-se austero. Essa é a preocupação maior dos que observam hoje o Brasil. A credibilidade sofrerá se o crédito externo financiar o consumo, como tantas vezes se viu no passado, se o governo não fizer o devido combate ao déficit público e se o Estado, enfim, continuar aprisionado nos antigos vícios populistas.
Sem ajuste fiscal, a calmaria externa é apenas, e sempre, transitória.

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