São Paulo, quarta-feira, 15 de janeiro de 1997
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Ensaios revelam múltiplas faces do cinema

JOSÉ GERALDO COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O fruto editorial mais substancioso das comemorações dos cem anos do cinema está chegando só agora às livrarias. É a preciosa coletânea "O Cinema no Século", organizada pelo professor e crítico Ismail Xavier.
Os ensaios que compõem o volume derivam das palestras dos autores num ciclo promovido pelo Museu da Imagem e do Som de São Paulo em 1994 e 1995.
A perspectiva do volume é multidisciplinar. Além de críticos brasileiros e estrangeiros, há entre os autores -todos de primeiro time- uma psicanalista (Maria Rita Kehl), um professor de filosofia (Nelson Brissac Peixoto), um professor de estética (Luiz Martins) etc.
O livro é organizado de modo a evidenciar as relações do cinema com outras áreas da produção cultural e da atividade humana.
Assim, os temas tratados abarcam desde "Cinema e Jornalismo" (Stella Senra) até "Cinema e Virtualidade" (Arlindo Machado), "Cinema e Poesia" (Eduardo Peñuela Cañizal) e "Cinema e Magia" (Amir Labaki).
Os estilos e abordagens são também os mais variados. Um ensaio rigoroso e panorâmico como o do historiador norte-americano Tom Gunning ("Cinema e História") sobre os primórdios do cinema, convive com um texto fecundamente caótico como o do cineasta Arthur Omar ("Cinema e Música"), inspirado na exibição do filme "Crônica de Anna Magdalena Bach", de Straub.
Filmes-sínteses
A maioria dos ensaios, aliás, lança mão da estratégia de escolher filmes específicos em que se sintetizam as características que os ensaístas querem analisar.
Desse modo, Ismail Xavier disseca "A Drunkard's Reformation" (1909), de Griffith, e "Janela Indiscreta" (1954), de Hitchcock, para esclarecer a noção de representação e espetáculo no alvorecer e no apogeu do cinema clássico.
No primeiro, mostra Xavier, prevalece a idéia de que o espetáculo (teatral ou cinematográfico) deve fornecer à platéia mensagens edificantes, "exemplos regeneradores". No segundo, realizado numa época pós-difusão da psicanálise, a função do espetáculo é catártica, oferecendo ao espectador o "crime por procuração" que neutraliza seu próprio impulso destrutivo.
Em outro ensaio estimulante ("Cinema e Imaginário"), Maria Rita Kehl se concentra em "O Fugitivo" (1993), de Andrew Davis, e "Os Imperdoáveis" (1992), de Clint Eastwood.
O primeiro seria um filme exemplarmente "paranóico", em que o perseguidor seria identificado com a personalidade paterna, enquanto o meta-western de Eastwood seria uma reflexão sobre a paranóia.
"Passion" (1981), de Godard, é a principal referência com que trabalha Nelson Brissac Peixoto para falar de "Cinema e Pintura".
No extremo oposto estão os ensaios de Carlos Augusto Calil ("Cinema e Indústria") e José Carlos Avellar ("Cinema e Espectador"), que concentram seu foco no cinema brasileiro e, sem descuidar da reflexão, têm uma preocupação prioritariamente informativa. Enfim, um banquete para os cinéfilos.

Livro: O Cinema no Século
Organizador: Ismail Xavier
Preço: R$ 30 (378 págs.)

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