São Paulo, quarta-feira, 15 de janeiro de 1997
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Líderes oposicionistas são incógnitas

ANDREW GUMBEL
DO "THE INDEPENDENT", EM BELGRADO

Líderes da oposição são incógnitas
Um já foi considerado mais perigoso e extremista do que o próprio Slobodan Milosevic. Outro foi hóspede constante, durante a guerra, de Radovan Karadzic, ex-líder dos sérvios bósnios e criminoso de guerra já indiciado. A terceira sempre pareceu simpática, mas uma das piadas comumente contadas a seu respeito é que ela não tem mais defensores do que caberiam numa sala de jantar.
Os três líderes oposicionistas sérvios -Vuk Draskovic, Zoran Djindjic e Vesna Pesic- podem ser os heróis do momento, agora que o poder popular se faz sentir nas ruas de Belgrado, mas, a julgar por seus históricos, não adequam-se ao papel que repentinamente lhes foi imposto pelas circunstâncias atuais.
É verdade que se saem muito bem quando se trata de pregar democracia, direitos humanos, liberalismo e abertura, mas o que poderia acontecer se Milosevic desaparecesse de repente e o país subitamente caísse em suas mãos?
A verdade é que ninguém sabe, principalmente não as dezenas de milhares de manifestantes que vão aclamá-los todos os dias e acompanhá-los em passeata em seus confrontos com a desanimada polícia antimotim de Milosevic.
No confuso mundo político balcânico, nem sequer é possível avaliar se estão sendo mais sinceros agora, quando abraçam com entusiasmo os valores ocidentais, do que foram anos atrás, quando defendiam um tipo menos agradável de política nacionalista e agressiva.
Ironicamente, a ascensão repentina da oposição se deve mais aos erros de Milosevic do que a qualquer grande avanço da própria oposição. Primeiro o presidente impeliu os partidos oposicionistas a formar uma coalizão -a lei eleitoral que aprovou antes das eleições municipais penalizava os partidos pequenos isolados.
O segundo erro de Milosevic foi anular as eleições, dando de bandeja à oposição uma plataforma básica comum a partir da qual ela pôde crescer: direitos democráticos fundamentais, liberdade de expressão, abertura ao mundo externo e assim por diante.
Antes das eleições, apenas Vesna Pesic, com seu minúsculo grupo de seguidores entre a ala contrária à guerra da intelligentsia de Belgrado, parecia realmente acreditar em tais princípios.
À medida que a crise avançava, a oposição comprovou sua criatividade. Ocupou espaço valioso na imprensa estrangeira.
O padrinho desse "inverno de Belgrado" tem sido Vuk Draskovic. Vuk, como as multidões o chamam, é veterano nesse tipo de coisa, tendo enfrentado os tanques do governo durante as últimas grandes manifestações oposicionistas no país, em março de 1991.
Ele vem provando ser um admirável combatente pelos direitos civis, pelo menos quando o que está em jogo são os seus próprios.
Mas não é tão simpático quanto parece -tornou-se conhecido em meados dos anos 80 como proponente inequívoco do nacionalismo sérvio e crítico de todas as minorias na Iugoslávia.
A plataforma de seu Movimento de Renovação Sérvia, agora -pelo menos teoricamente- deixada de lado, ainda tem como meta principal a união de todos os sérvios.
Quando as guerras nos Bálcãs tiveram início, cinco anos atrás, Vuk aplaudiu dos bastidores, e ele criticou o acordo de paz de Dayton, qualificando-o de exemplo vergonhoso de entreguismo.
Djindjic
Um candidato mais sério ao poder e o astro ascendente do movimento de protestos é Zoran Djindjic, cuja carreira política começou nos anos 80 com ataques veementes ao nacionalismo e cujas metas atuais -livre comércio, livre mercado, abertura ao Ocidente- estão mais afinadas com o exterior.
Seu Partido Democrático contém alta proporção de pesos-pesados intelectuais e é o que causa melhor impressão nas embaixadas estrangeiras em Belgrado.
Mas Djindjic também é um enigma. Quando estudante, era seguidor da escola de Frankfurt, de inspiração marxista, mas agora criou vínculos com partidos de direita, entre eles o Força Itália e o Partido Conservador britânico.
Tendo combatido os nacionalistas nos anos 80, passou a última parte da guerra se engraçando com os sérvios bósnios e rejeitando a autonomia de Kosovo, de população majoritariamente albanesa.
A maioria dos analistas vê Djindjic como oportunista. Por enquanto, pelo menos, o oportunismo pede uma adaptação cuidadosa dos valores liberais ocidentais, para arrancar a Sérvia de seu isolamento internacional. O nacionalismo pode ser a chave para a popularidade na Sérvia, mas este não é o momento certo de proclamá-lo.

Tradução de Clara Allain

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