São Paulo, sábado, 25 de janeiro de 1997
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'Revolução' traz 2º escalão do Iluminismo

SYLVIA COLOMBO
DA REDAÇÃO

"Esperamos que nossos leitores sejam tolerantes com os erros e falhas que são inevitáveis no início de um empreendimento tão complicado como o nosso." Com essas palavras desculpava-se um editor de um dos primeiros jornais que surgiram na França depois da Revolução Francesa (1789).
O papel impresso como agente das transformações daquele período é o tema de "Revolução Impressa - A Imprensa na França", livro organizado pelos historiadores de cultura popular Robert Darnton e Daniel Roche.
A proposta acaba sendo superada pelas dimensões que o evento ganhou durante todo o século 19. Com a demolição do Antigo Regime, a letra impressa foi a ordenadora de um novo sistema administrativo, religioso e cultural. Pelo simples fato de existir sem concorrentes (televisão, rádio, internet) num mundo longe das facilidades da globalização.
Darnton, que já havia tratado do tema da literatura clandestina em "Boêmia Literária e Revolução", tenta novamente trazer à luz o segundo escalão do Iluminismo: escritores que ficaram anônimos para a história, mas que ajudaram a traduzir para o alcance popular as obras de Voltaire, Diderot, Rousseau e outros.
Essa característica do autor, de dar relevo a aspectos "menores", antes desprezados pela historiografia, faz a originalidade de cada trabalho seu e é a mola mestra desta coletânea.
Antigo Regime
A primeira parte do trabalho dedica-se a descrever a indústria editorial durante o Antigo Regime, mostrando o quão relacionada estava com as instituições vigentes.
A política de censura acontecia de duas formas. Uma antes de o livro ser publicado, oficiada por censores que negociavam com os editores. Em troca de cooperação, esses eram recompensados com o monopólio do comércio.
A outra passava pela apreensão do material já publicado. A conclusão da análise das duas formas leva, entretanto, para a assertiva de que nunca as obras proibidas teriam deixado de circular. Todo um sistema clandestino e até um glossário (os livros "filosóficos" designavam as obras sediciosas) garantiam essas relações.
A censura foi aumentando de acordo com o calor dos acontecimentos que culminariam na queda da Bastilha. É interessante ressaltar que em 1660 havia apenas dez censores em toda a França, número que aumentou para 160 à época da Revolução.
Como um termômetro preciso, a "filosofia" significava perigo, e o momento de maior repressão foi, não coincidentemente, aquele em que as coisas se precipitaram.
Num segundo momento, o livro analisa os efeitos da Revolução na política dos livreiros e na destruição das corporações "medievais". O fato cultural novo, aí, é a formação da nova elite editorial, que entraria no século 19 ditando tendências. Essas, fincadas no Iluminismo, fizeram proliferar os ensaios políticos, filosóficos e eróticos.
A relação entre liberdade e libertinagem não é casual, funda-se na mesma postura revolucionária de determinado grupo, a nova elite: a ousadia e a busca pelos prazeres.
Em termos de formato, a democratização da palavra impressa levou à proliferação dos folhetos, jornais e opúsculos em detrimento do elitismo dos livros.
"Sem a imprensa podem conquistar a Bastilha, mas não podem derrubar o Antigo Regime", diz Darnton em sua introdução. Apesar de uma construção fragmentada, a idéia da coletânea se mostra clara em apresentar os primeiros sussurros da primeira sociedade a se pretender universal. O que se escrevia, em livros, jornais ou manifestos, tornava-se também uma das primeiras revoluções culturais importantes da era moderna.

Livro: Revolução Impressa - A Imprensa na França De: Robert Darnton e Daniel Roche (orgs.)
Lançamento: Edusp
Preço: R$ 35 (416 páginas)

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