São Paulo, sábado, 25 de janeiro de 1997
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Livro recupera mitos do teatro de revista

DANIELA ROCHA
DA REPORTAGEM LOCAL

O jeitinho brasileiro, a malandragem, a certeza de que Deus nasceu neste país e de que somos os representantes mundiais da mulata e do samba estão muito bem registrados em um gênero teatral: o teatro de revista, que teve seu auge no Rio de Janeiro dos anos 20 e 30.
Para fazer um levantamento detalhado do que significou o teatro de revista brasileiro, a pesquisadora da Universidade de Campinas Neyde Veneziano ficou três meses em Portugal e pesquisou outros tantos no Brasil para localizar fotos e textos e entrevistar os astros da época para sua tese de doutoramento, que virou o livro "Não Adianta Chorar - Teatro de Revista Brasileiro... Oba!", recém-lançado pela Editora da Unicamp.
Revendo a revista
O teatro de revista é um teatro de variedades encenado em quadros ou esquetes, sempre com música. Um personagem central, o compadre, passa por todos os quadros. "Nessa andança, ele se depara com várias situações inusitadas e sempre envereda pela política", diz Veneziano. Como as piadas eram sempre atuais, o personagem central correspondia a uma caricatura viva. O humor era o do duplo sentido, mas nunca com palavrão e, às vezes, com sensualidade.
"É um teatro que visa a crítica social, tem procedimento cômico e é popular, com estética popular, feito para o povo", define.
O nome "revista" vem de rever, passar em revista os acontecimentos do ano. "É como fazer uma retrospectiva, só que de forma crítica, satírica e cômica, ponteada por paródias", conta.
O gênero surgiu na França, foi exportado para Portugal e só então chegou ao Brasil, por volta de 1870.
Em sua pesquisa, Veneziano verificou que no Brasil o teatro adquiriu características e personagens próprios. "Foi com o teatro de revista que o público começou a assistir espetáculos no português falado no Brasil. Até então sé se falava o português de Portugal nos teatros." Isso porque foi no teatro de revista brasileiro que apareceram as figuras características daqui, como o malandro, a baiana e a mulata no Rio e o caipira em São Paulo. "No Brasil houve algo da etnia, da raça e da ginga que se encaixou perfeitamente ao modelo do teatro de revista."
Mas a pesquisa de Veneziano é centrada apenas no teatro de revista carioca. "No Rio o gênero exercia um grande poder de sedução. Não havia quem visitasse a cidade e não fosse ver um espetáculo na praça Tiradentes."
Auge nos anos 20
Ela identifica três fases distintas do teatro de revista brasileiro. Numa primeira está Arthur de Azevedo, que trouxe o gênero ao Brasil.
"É uma fase marcada por bons autores e cômicos. Houve até uma encenação que explicava o funcionamento do gênero."
Foi na segunda fase, nas décadas de 20 e 30, que o teatro de revista encontrou seu apogeu no Brasil. "Existia um equilíbrio maior, com bons autores, bons cômicos, boa música e noção de que aquilo era um espetáculo." A decadência começou nos anos 40. "A revista saiu da praça Tiradentes e foi para a Cinelândia. É nessa fase que o espetáculo, o luxo, começou a abafar o texto." E, nos anos 50, a revista desaparece. "Não se fazem mais espetáculos luxuosos, as montagens são encenadas na periferia e existe uma confusão entre teatro de rebolado e revista", afirma.
Um dos grandes cômicos da Revista carioca foi Oscarito, antes de partir para o cinema.
A estrutura dos espetáculos exigia, além de um grande cômico (que faria a caricatura viva para escrachar políticos), uma grande vedete (que cantava, dançava e improvisava para divertir o público), as coristas (mais tarde chamadas de girls, com suas pernas à mostra), uma orquestra, muito cenário, luzes e escadarias.
O texto, no entanto, era dos itens mais importantes. Nele estavam os códigos, os duplos sentidos, como: "Tome ferro", para as meninas, e "Comidas, meu santo!", para os rapazes.

Livro: Não Adianta Chorar - Teatro de Revista Brasileiro... Oba!
Autora: Neyde Veneziano
Lançamento: Editora da Unicamp
Preço: R$ 22,50 (208 págs.)

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