São Paulo, segunda-feira, 27 de janeiro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Amarrado ao passado

LUÍS NASSIF

Não se mexe na política cambial não por estar certa, mas pelo receio das consequências.
Os efeitos de acelerações na política cambial seriam da seguinte ordem:
1) Haveria reflexo amplo sobre a estrutura de preços das empresas, dado o aumento expressivo dos componentes importados.
2) Para evitar a propagação sobre preços, o governo teria que adotar série de medidas de cunho recessivo. A empresa não repassa, porque não consegue comprador. Aumento de custo não repassado significa mais dificuldades para as empresas, mais quebradeira e desemprego no curto prazo.
3) Além disso, o governo teria de ampliar o nível de corte de gastos públicos. Como a estrutura de pessoal é inflexível, acabaria afetando gastos sociais.
4) A desvalorização do real implicará em perda do valor do salário real dos trabalhadores. Aliás, a maneira da desvalorização se refletir sobre os preços dos produtos exportados é justamente reduzindo o valor real dos salários.
5) Para manter a atratividade, o Banco Central teria que aumentar a taxa de juros dos títulos públicos mais que proporcionalmente ao nível da desvalorização cambial, para compensar a insegurança em relação ao futuro da política cambial.
6) O aumento dos juros traria impactos pesados sobre o serviço da dívida pública que, hoje em dia, se constitui no principal item a produzir déficit público.
7) Por outro lado, a não adoção de medidas corretivas poderá tornar insustentável a situação da economia, obrigando a ajustes dolorosos mais à frente.
Impasse
Por que se chegou a esse impasse horroroso, em que déficit externo e déficit público assumiram posição tão ameaçadora?
Porque em 1994 e 1995 o país se desarmou de toda forma de defesa em relação a experimentalismos macroeconômicos.
Processos de ajuste de empresas e de países exigem ações equilibradas, que resolvam determinados problemas, sem afetar outras áreas da empresa. E ponto essencial de qualquer gestão responsável é a não ampliação do endividamento além de limites estritamente necessários. Não é necessário ser nenhum gênio para saber que endividamentos são correntes que atrelam o futuro ao passado da companhia. Dependendo do peso, comprometem todo o futuro.
A falta de institutos jurídicos sérios, a retórica do fim do mundo, permitiu que, desde fins de 1979, passassem a atropelar contratos, fabricar passivos gigantescos, confiando em, num futuro distante, resolver a questão via calote, jogando com sub-reajustes da correção monetária.
Esse mundo subdesenvolvido acabou em 1992, quando foi ordenada a primeira liberação de cruzados pelo desembargador Américo Lacombe. E a possibilidade de diluir passivos com jogos de reajuste acabou-se com o próprio fim da inflação.
Mas a irresponsabilidade prosseguiu e chegou ao ápice com os erros cambiais de 1994 e a política monetária absurda de 1995.
O resultado é esse: impasses importantes na condução da política econômica e recursos sendo desviados de fins sociais para financiar a dívida pública.
Espera-se apenas que, depois do desastre consumado, aprenda-se a lição definitivamente. Quando a opinião pública se desarma em relação a medidas de política econômica, e coloca o destino do país nas mãos de dois ou três técnicos, não pode sair coisa boa.
Veríssimo
Contaram-me outro dia que o grande João Antônio, recentemente falecido, desenvolvera estranha sensibilidade para identificar, na mídia, os músicos. Pelo modo de escrever, de expor raciocínios, ele sabia quem fazia parte da "tribo" musical.
O escritor Luiz Fernando Veríssimo, cujo lado de humor é imbatível, é músico, de texto, prática e caráter. Posto que, está aceito seu convite para um dueto formulado em sua coluna de sábado, no "Jornal do Brasil", a pretexto de esclarecer mal-entendidos entre nós sobre posições parcialmente conflitantes em relação a Barbosa Lima Sobrinho.
Aceito, com o Aldir Blanc e o Pelão como testemunhas.

Texto Anterior: Seguros, os números de 96 não foram tão bons
Próximo Texto: Grupo português investe US$ 398 mi
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.