São Paulo, sexta-feira, 31 de janeiro de 1997
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BC vê má-fé em operações feitas por Pitta

CARI RODRIGUES
FERNANDO GODINHO

CARI RODRIGUES; FERNANDO GODINHO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Relatório fala em juros 'absurdos' e lucros 'extraordinários' que geram prejuízo de R$ 8,3 mi para SP

Relatório reservado do Banco Central aponta fraudes em operações financeiras feitas pela Prefeitura de São Paulo à época em que Celso Pitta, atual prefeito, era secretário de Finanças da gestão Paulo Maluf. "Parece claro que houve motivação dolosa (má-fé)," anota o documento, obtido ontem pela Folha.
O texto diz que a prefeitura negociou com corretoras e distribuidoras que depois fizeram outras transações com "empresas de fachada", constituídas exclusivamente para funcionar como "receptoras de recursos de procedência ilícita". Mais: afirma que "a análise do fluxo das transações evidencia a existência de esquema de desvio de recursos públicos".
O BC investigou operações de compra e venda de títulos municipais feitas entre 1º de dezembro de 94 e 13 de fevereiro de 96. Concluiu que a prefeitura teve um prejuízo de R$ 8,396 milhões com as transações, feitas com 15 instituições financeiras.
As conclusões do BC foram remetidas à CPI do Senado que investiga o mercado de títulos públicos. Dois pontos principais sustentam a suspeita de dolo, de acordo com a análise feita pelo BC:
1) A prefeitura pagou aos compradores de títulos juros muito acima dos praticados pelo mercado. Mencionam-se várias operações. Uma delas com a empresa Áurea DTVM, fechada pelo governo em novembro de 95. O BC afirma que a prefeitura de São Paulo concedeu à Áurea "um deságio absurdo de 85,35% ao ano". A transação foi feita em 21 de setembro de 94.
2) A prefeitura optou por trabalhar com empresas de pequeno porte, sem tradição. Normalmente, títulos públicos são vendidos diretamente a bancos de porte maior ou fundos de pensão.
Outro detalhe registrado no documento do BC: as pequenas corretoras e distribuidoras registraram, em outras operações, prejuízos em valores praticamente idênticos aos lucros obtidos nos negócios com a prefeitura.
Em uma frase, o documento levanta a suspeita de envolvimento de "empresas-laranja" no negócio: "Com a mesma agilidade com que elas obtiveram generosos lucros, sofreram prejuízos na mesma proporção, ou seja, anularam os ganhos extraordinários."
Fora do ramo
Os prejuízos aconteceram nos negócios com distribuidoras e corretoras. Essas instituições financeiras fizeram operações deficitárias em valor praticamente igual aos lucros que obtiveram nos negócios com a prefeitura. Esses prejuízos aconteceram em operações com empresas sem cadastro ou experiência no ramo financeiro. Diz o relatório do BC: "Conforme seus estatutos sociais, essas empresas atuam nos seguintes ramos: agropecuária, mão-de-obra temporária, assessoria empresarial, incorporação, comércio de materiais elétricos, indústrias de plásticos, recursos humanos etc.".
Logo no parágrafo seguinte, usam-se termos mais duros. "É notória a incompatibilidade de seu porte com sua movimentação financeira, levando-nos a crer em empresas de fachada, constituídas exclusivamente para esse propósito, qual seja, receptoras de recursos de procedência ilícita."
As análises do Banco Central centraram-se principalmente nas operações da prefeitura com as corretoras e distribuidoras. Os técnicos concluíram que houve "custo adicional (e desnecessário) ao Erário Municipal". A transcrição é literal do relatório.
Quando negocia um título, qualquer governo oferece um deságio, que, normalmente, reflete os juros de mercado -só que no período da negociação, a taxa média dos títulos públicos acumulou 9,4%, enquanto a prefeitura pagou 23,5% pelos papéis.
Ontem, a CPI do Senado adiou a convocação de Pitta, sugerida pelo senador Eduardo Suplicy (PT-SP).
O relator da CPI, senador Roberto Requião (PMDB-PR), reafirmou, porém, que o prefeito será ouvido. "Meu relatório não será concluído sem que seja tomado o depoimento do prefeito Pitta."

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