São Paulo, sexta-feira, 31 de janeiro de 1997
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'Podem falar o que quiserem, mas daqui eu não vou sair'

HENRIQUE SKUJIS
DA REPORTAGEM LOCAL

O chão pode sumir em segundos, a parede, desmoronar a qualquer momento, e o teto, desabar sem avisar.
Segundo a Defesa Civil Municipal, cerca de um milhão de paulistanos tem essa sensação quando entra em casa.
São os moradores de casas em áreas de risco, que estão na iminência do desabamento. No período de chuvas, o perigo aumenta.
A maioria dos moradores dessas áreas não atende à recomendação da prefeitura de deixar as casas porque não tem para aonde ir.
Eunice Moreira Santos mora com o marido e duas filhas em uma rua que teve boa parte dos moradores levada a abrigos da prefeitura.
"Se eles me mandarem sair daqui vou ter que dar um jeito para ter aonde ir", diz Eunice.
Há também quem acredite que a própria casa não vai cair.
É o caso da aposentada Maria das Dores Coelho, 73, que mora sozinha na encosta de um morro no Parque Novo Santo Amaro (zona sul da cidade).
Há três meses, um terreno colado à sua casa desmoronou e, na terça-feira, foi a vez de uma escadaria despencar, colocando a casa em risco.

*
Folha - A prefeitura já solicitou que a senhora deixasse a casa?
Maria das Dores Coelho - Já pediu duas vezes.
Folha - Por que a senhora não atende ao pedido da prefeitura e se muda para outro lugar?
Maria - Mudar para onde? Não tenho para onde ir.
Folha - Mas sua casa pode desabar a qualquer momento.
Maria - Não desaba. Pode entrar e olhar. Ainda não apareceu nenhuma rachadura.
Folha - A escadaria não desabou na terça-feira?
Maria - A escada desceu, mas não afetou a estrutura da casa, que foi muito bem construída. A culpa é da tubulação.
Folha - O quarto no fundo também não está ameaçado?
Maria - Não sei, mas aí não mora mais ninguém.
Folha - A prefeitura disse que vai deixar a senhora continuar morando aqui?
Maria - Eles podem falar o que quiserem, mas daqui eu não saio.

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