São Paulo, sexta-feira, 31 de janeiro de 1997
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Pitta afirma ter sido testado no 1º mês

ROGÉRIO GENTILE; RICARDO FELTRIN
DA REPORTAGEM LOCAL

Prefeito de São Paulo diz em entrevista que sofreu pressões de vários setores, mas que passou no 'teste'

Celso Pitta (PPB), 50, diz que seu primeiro mês à frente da Prefeitura de São Paulo foi um "batismo político". Para ele, o "batismo" veio na forma de pressões: empreiteiras cobrando dívidas; empresas de ônibus pedindo aumento nas passagens ou subsídio e vereadores exigindo cargos públicos. Fora a greve no transporte coletivo.
O prefeito avalia que essas pressões foram, na verdade, um teste. E que ele foi aprovado.
Apesar de vender a imagem de ser um governo de continuidade, a gestão Celso Pitta ainda está praticamente paralisada. Há estudos, idéias, projetos nas mesas. Tudo ainda é teoria.
As primeiras promessas não foram cumpridas: a "faxina" na cidade, que seria limpa em 15 dias, ainda não surtiu efeito, e o comércio ambulante permanece caótico.
A seguir, trechos da entrevista que o prefeito de São Paulo concedeu anteontem, antes de a Folha obter relatório do Banco Central sobre supostas operações irregulares com títulos da prefeitura (leia em Brasil).
*
Folha - Em um mês, o senhor já enfrentou pedidos de aumento das passagens ou subsídios, pressão de vereadores e uma greve no transporte. É um bom começo?
Celso Roberto Pitta - Diria que foi um batismo. Este primeiro mês foi o meu batismo como prefeito.
Folha - Governar é mais difícil do que o senhor pensava?
Pitta - De forma alguma. Veja bem, não é um calouro quem está aqui. Até pelo meu trabalho no secretariado... Eu já tinha experiência. São quatro anos no governo.
Folha - Por que ocorreu a greve de ônibus?
Pitta - Eu a atribuo a uma inconsequência de um sindicato que se arvorou ao direito de parar uma cidade sem esgotar todas as negociações. Foi inconsequente.
Folha - O senhor acha que as empresas facilitaram a greve?
Pitta - Você está falando numa possibilidade de consentimento por parte dos empresários com relação ao movimento. Descarto isso, porque seria admitir um crime contra a economia popular. Seria totalmente contraproducente. O que a greve mostrou? Que existe um sistema alternativo de transporte (perueiros) que numa situação de emergência atende as necessidades da população -o que enfraquece sobremaneira a posição dos empregadores.
Folha - O senhor acha que algum dia o transporte deixará de ter subsídio (que hoje é de R$ 0,05 por passagem)?
Pitta - Não. Não vejo isso como sendo possível. Sempre haverá subsídio.
Folha - O senhor acha que o sindicato o estava "testando"?
Pitta - Não só o sindicato como forças políticas, (vereadores) que logo num primeiro momento procuraram um embate direto comigo. Não é embate especificamente comigo, mas com um recém-chegado, que não tem perfil de governante. Foi o caso das administrações regionais.
Folha - O senhor já ficou desiludido nesse primeiro mês?
Pitta - Não, pelo contrário. Sou movido a desafios. Cada vez acordo mais cedo...
Folha - Quando a cidade vai deixar de sofrer com as enchentes?
Pitta - Hoje nós temos um encaminhamento favorável a essa decisão. Estamos investindo e trabalhando na nossa esfera de atuação. Trabalho que está sendo complementado pelo governo do Estado. Antes, tínhamos uma situação em que cada um encaminhava sem uma coordenação de esforços. O que eu tenho a dizer é: não temos uma data. Estamos caminhando.
Folha - O Procav (o programa de canalização de córregos) não agravou as enchentes no Tietê?
Pitta - Não. Nós fizemos o nosso dever de casa. Só que esse dever de casa vai ter um resultado muito maior porque, além de canalizar trechos no município, vamos ter o suporte da limpeza e aprofundamento da calha do Tietê e construção de piscinões em municípios fora de São Paulo.
Folha - Se o trabalho conjunto entre Estado e município pode resolver o problema, por que não foi feito antes?
Pitta - Não vou agora parar o que estou fazendo para fazer análise retrospectiva...
Folha - Mas é um exemplo de como simples diferenças partidárias podem prejudicar a vida de milhões de pessoas...
Pitta - Talvez essa cooperação só pudesse ser iniciada depois de uma fase, digamos, de não-cooperação. Saber agora o que poderia ter sido feito, o que deixou de ser feito... Vamos olhar para frente.
Folha - Quanto a prefeitura vai investir no rodoanel?
Pitta - Hoje falei com o governador Covas e vamos formalizar a constituição de um grupo de trabalho na terça. Esse grupo vai definir a parte de cada governo.
Folha - O senhor considera as regionais como focos de corrupção?
Pitta - Esse problema, a corrupção, tem que ser combatido permanentemente. Se estiver presente, se for constatado, deve ser extinto de forma legal.
Folha - Dos cerca de 20 fiscais acusados de corrupção, segundo a CPI dos Ambulantes, muitos continuam trabalhando normalmente.
Pitta - Você volta a falar do passado e eu olho para o presente. Estamos criando mecanismos de fiscalização e controle para inibir ou acabar com a vulnerabilidade do sistema atual.
Folha - O senhor pretende fazer o quê em relação à segurança?
Pitta - Vamos aumentar o efetivo da guarda para 10 mil homens.
Folha - Ainda este ano?
Pitta - Não, este ano não dá para chegar aos 10 mil homens. O que é muito bom é que li hoje (anteontem) que o presidente Fernando Henrique apóia meu projeto de municipalização da polícia.
Folha - O que será feito dos servidores que não aderiram ao PAS?
Pitta - Vamos trazê-los de volta para a Saúde. Como bom economista, entendo que qualquer subutilização de recursos incomoda. Saber que existem profissionais de saúde até sem trabalhar me incomoda. Dei orientação para que os secretários da Saúde e da Administração reconduzam essas pessoas para suas funções.
Folha - O senhor tem falado com o ex-prefeito Maluf?
Pitta - Falei com ele hoje, falei ontem...
Folha - O senhor ainda se aconselha com ele?
Pitta - Aconselhar não. Tomamos um chope e comemos uma pizza juntos no domingo retrasado. Eu converso com ele, mas não tem sido tema das nossas conversas a prefeitura.
Folha - Mas e quando o senhor precisa de algum dado?
Pitta - Toda a memória da prefeitura está comigo (apontando para os computadores), inclusive parte do secretariado do Maluf.
Folha - O senhor disse que era contrário à reeleição para os atuais governantes. Com a perspectiva da reeleição ser aprovada pelo congresso (já foi na Câmara em primeira votação), o senhor pretende se recandidatar?
Pitta - Honestamente, não estou preocupado com isso. Consegui sempre fazer um bom trabalho e fui sendo promovido até a condição atual. Se, no final do mandato, eu tiver o reconhecimento da população, aí sim vamos pensar.
Folha - Colocar o engenheiro Carlos Venturelli, que gosta de garimpar espaço na mídia, para cuidar da limpeza, foi uma jogada de marketing?
Pitta - O maior marketing que eu posso fazer é ter a cidade limpa. Ele (Venturelli) pode falar o que quiser. Se o cidadão olhar a calçada e a vir suja não adianta nada.
Folha - Ele disse que ia limpar a cidade em 15 dias e, é óbvio, não conseguiu.
Pitta - Ninguém pode negar o esforço que estamos fazendo. Claro, a gente limpa e o pessoal suja, a chuva suja. O que vale é a determinação política. A primeira coisa que se espera de um prefeito é que ele varra a cidade. É elementar, meu caro Watson.

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