São Paulo, sexta-feira, 31 de janeiro de 1997
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Ministra esconde lobby pró-México

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

A responsável pelo comércio exterior dos EUA, Charlene Barshefsky, declarou à Comissão de Finanças do Senado que "nenhuma vez durante os 18 anos" em que atuou na iniciativa privada ela "fez lobby em favor de qualquer governo ou entidade estrangeira junto ao governo dos EUA".
Mas a Folha obteve documentos assinados por Barshefsky que mostram que em maio de 1991 ela foi contratada por duas organizações mexicanas para ajudar o México no processo de aprovação do Nafta (Tratado Norte-Americano de Livre Comércio).
Uma porta-voz do USTR (órgão em nível de ministério do governo dos EUA encarregado da política de comércio exterior do país) recebeu cópia dos documentos em posse da Folha e declarou não haver contradição entre eles e a declaração de Barshefsky ao Senado: "Nunca, formalmente, a senhora Barshefsky fez lobby pelo México junto aos poderes Executivo ou Legislativo dos EUA".
O México fez um dos maiores esforços de lobby da história dos EUA em 1991 para obter a aprovação do Nafta pelo Congresso. A Folha também conseguiu documentos similares aos assinados por Barshefsky, redigidos em termos quase idênticos, que comprovam a contratação de diversas outras empresas de lobby de Washington por entidades mexicanas na mesma época.
Uma lei de autoria do então senador Bob Dole e sancionada em 1995 pelo presidente Bill Clinton proíbe que pessoas que tenham prestado serviços a governos estrangeiros assumam o USTR.
A Comissão de Finanças do Senado aprovou ontem uma suspensão da aplicação da lei no caso de Barshefsky. Ela admite ter trabalhado para o Canadá em 1990 num caso de comércio de madeira. Mas nega a conexão mexicana.
A suspensão da lei ainda precisa ser aprovada pelas duas casas do Congresso. O deputado James Traficant Jr., que pertence ao Partido Democrata (governo), disse à Folha que vai votar contra.
"É um mau precedente. As leis não são feitas para serem suspensas a fim de atender a interesses específicos. Barshefsky está fazendo um bom trabalho no USTR. Mas isso não significa que ela seja a única pessoa qualificada para o cargo no país. Muitos outros poderiam estar fazendo um trabalho equivalente sem ter ferido a lei".
O Centro para Integridade Pública, entidade não-governamental bastante respeitada em Washington, também se manifesta contra a suspensão da lei e contra a confirmação de Barshefsky no cargo, que ela vem ocupando interinamente desde abril de 1996, quando seu titular, Mickey Kantor, substituiu Ron Brown à frente do Departamento do Comércio.
A Comissão de Finanças também aprovou ontem o nome de Barshefsky para a função. Agora, o plenário do Senado deve se manifestar a respeito da indicação. A Folha tentou ouvir o presidente da comissão, William Roth, e um integrante dela, John Chaffee, sobre a conexão mexicana de Barshefsky, mas, até às 19h de ontem, nenhum deles havia respondido às mensagens deixadas com seus assessores de imprensa.
'Negociadora dura'
Barshefsky é muito apreciada pelos conservadores, inclusive os do partido de oposição, que controlam o Senado. Eles concordam com a avaliação pública que o presidente Bill Clinton faz dela: "A mais dura negociadora que já representou os EUA".
Apesar de o déficit comercial dos EUA com o Japão e a China, países com os quais Barshefsky negociou extensivamente nos últimos quatro anos, só ter aumentado no período, ela é considerada eficiente pela maioria dos congressistas.
Entre diplomatas brasileiros, o estilo de Barshefsky é com frequência definido como "truculento".

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