São Paulo, sexta-feira, 31 de janeiro de 1997
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SAIR PARA QUÊ?

Na tentativa de eliminar parte da suposta vantagem que os governantes teriam ao se candidatar a um segundo mandato, políticos oposicionistas ameaçam levar a questão da desincompatibilização ao Supremo Tribunal Federal. Isso porque a redação final do texto da emenda da reeleição é omissa com relação ao tema, o que é interpretado de maneiras diferentes por vários juristas.
O parágrafo 6º do artigo 14 da Constituição é claro ao exigir a renúncia, até seis meses antes do pleito, dos chefes do Executivo se estes desejarem se candidatar "a outros cargos". Com base nesse parágrafo, muitos acreditam que tal exigência também deveria ser estendida aos que se candidatam a um novo período no cargo que já ocupam.
Independentemente da interpretação jurídica, é necessário destacar a clara inutilidade ou até mesmo o caráter nocivo da exigência de afastamento do cargo dos que decidirem tentar disputar a reeleição.
A renúncia do governante até seis meses antes prejudicaria o caráter de continuidade que deveria ter a sua candidatura. O argumento de que a máquina administrativa deixaria de ser utilizada não se sustenta. Assim como muitos chefes do Executivo já usam a estrutura oficial para favorecer seus candidatos, o mesmo poderia fazer o vice que estivesse substituindo o titular. Cabe à sociedade fiscalizar a ação do poder público e punir os abusos por meio do voto.
Suponha-se ainda que, nos últimos seis meses, houvesse a necessidade de o governo tomar medidas impopulares. O possível ônus poderia ser absorvido apenas pelo substituto, isentando de responsabilidades o candidato à reeleição. Se pode representar uma facilidade devido ao possível uso da máquina, permanecer no cargo durante a campanha acrescenta também um desafio ao governante/candidato: fazer, além de bons discursos, um governo competente até mesmo em seus meses finais.
A satisfação de prefeitos, governadores e do presidente da República com a aprovação da emenda na Câmara passa a equivocada impressão de que a mudança só colabora para a efetiva reeleição dos mandatários. A história prova que, para muitos -como para o então presidente norte-americano Jimmy Carter, que tentou, sem sucesso, a reeleição em 1980 enfrentando um cenário externo que lhe era extremamente desfavorável-, vencer um pleito estando no poder pode não ser tão fácil.

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