São Paulo, quinta-feira, 2 de outubro de 1997
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Se você não se cuidar, o 'bug' do milênio vai pegá-lo

DAVID DREW ZINGG
EM SAMPA

"Se você não entende uma coisa, é porque deve ser importante."
Velhor ditado jornalístico

(Nota ao leitor: o que escrevo a seguir é sério e é verdade. Vai afetar cada um de nós. Juro que não estou inventando nada. DDZ.)
É a última vez que lhe aviso, Joãozinho. Provavelmente.
Se você não acordar e enfrentar esse problema agora, já, você e seu mundo vão fechar, entrar em pane, dar um "tilt", tirar férias coletivas prolongadas, parar de funcionar e, pura e simplesmente, explodir.
"Que problema?", pergunta você, inteligentemente.
"O problema do 'bug' do ano 2000", respondo, ainda mais inteligentemente.
(Tio Dave avisou você do problema do "bug" do ano 2000 numa coluna recente. Você não deu bola. Afinal, um "bug" de computador é um assunto muito chato, e você não tem tempo para assuntos chatos.)
Mas você fará bem em prestar atenção a esse tal de "bug" do milênio, Joãozinho.
Segue uma matéria divulgada recentemente pela agência de notícias inglesa "PA News":
"'1º de janeiro do ano 2000 -Será que as luzes de Londres vão se apagar?'
Segundo um grupo de especialistas em informática, Londres corre o risco de parar em consequência da crise dos computadores provocada pela chegada do ano 2000.
Entre as previsões de desastre contidas num relatório recente da Corporation 2000, figuram:
. Os bancos podem ficar fechados pela maior parte do mês de janeiro de 2000.
. As linhas telefônicas podem operar corretamente apenas 75% do tempo.
. Perturbações maciças no fornecimento de energia elétrica durante dezembro de 1999 e janeiro de 2000.
. O fechamento quase completo dos sistemas de transportes aéreo, terrestre e marítimo.
. A Bolsa de Valores pode ficar fechada entre 1º de dezembro de 1999 e 24 de janeiro de 2000.
. O trabalho dos correios pode sofrer transtornos durante dez dias.
. As escolas podem ficar fechadas por quatro semanas.
. Os hospitais podem atender apenas casos de emergência durante quatro semanas."
O estudo em questão foi encomendado pelo Partido Trabalhista Britânico e conclui que o governo não está fazendo o suficiente para enfrentar o problema. Recomenda a indicação de um ministro especial, que seria encarregado de organizar a resposta da sociedade ao problema.
Um pensamento repentino e assustador invade o único neurônio que tio Dave possui.
Se Londres, com sua obsessiva pontualidade britânica, parece estar se encaminhando para um desastre generalizado de informática, o que será que vai acontecer aqui na Terra do Amanhã, pelo amor de Deus?
Afinal, o que é o "bug" do ano 2000?
O "bug" do ano 2000 é tão simples que até eu consigo entender.
Quando os relógios passarem de 31/12/99 para 01/01/00, uma grande parte dos computadores do mundo não vai saber que o "00" se refere ao ano 2000. No lugar disso, esses computadores vão retroceder 100 anos. Vão acreditar que é o ano 1900 que está começando.
Experimentem fazer o seguinte teste, muito simples, vocês felizes proprietários de sistemas de PC baseados em "Windows". Ele demonstra a horrível simplicidade do problema. Liguem seus computadores. Mudem a data para 31/12/99. Mudem a hora para 23h58. Desliguem o computador. Tomem um cafezinho. Depois de alguns minutos, liguem o computador outra vez.
Entrem no modo DOS. Digitem "date" e pressionem a tecla "enter". Olhem para a tela.
Socorro!
A data deveria ser domingo, 1º de janeiro de 2000. Não se surpreendam se não for. Muitos sistemas DOS retrocedem para 1980. Alguns sistemas mais antigos nem sequer aceitam datas posteriores a 31/12/99.
Peter de Jager, um dos grandes agitadores a trazer à tona o problema do "bug" do ano 2000, acredita que 97% dos PCs IBM não vão passar nesse teste.
O Tempo é Curto
No momento em que escrevo estas linhas, faltam apenas dois anos, 93 dias, cinco horas, 56 minutos e 41 segundos para 1º de janeiro de 2000. A tarefa de reorganizar a maioria dos computadores do mundo (incluindo o seu) é desanimadora.
Por trás de todas as coisas mágicas que já nos acostumamos a esperar de nossos computadores, existe uma chamada "código fonte". É ele que faz o computador de seu banco lhe entregar seu dinheiro, que mantém os aviões voando e que me permite escrever no meu Macintosh (*).
Para assegurar que o Brasil (e todo o maldito mundo informatizado) não feche na virada do milênio, há bilhões e mais bilhões de linhas de código fonte que terão que ser reescritas.
Outra organização que presta assessoria em informática, o Gartner Group, acaba de divulgar um estudo que mostra que uma grande parcela das empresas e dos governos no mundo não está se preparando adequadamente para os cataclismos de informática que vêm por aí.
O estudo constatou que boa parte das empresas do mundo ainda não começou a enfrentar o problema do "bug" do ano 2000.
A pesquisa também mostrou que grandes instituições, como universidades, hospitais e órgãos governamentais, estão muito atrasadas nos esforços que vêm fazendo nesse sentido.
Na semana passada, o presidente do comitê do Congresso norte-americano que cuida de questões relativas à informática atribuiu "notas" aos esforços feitos por 24 órgãos do governo para se preparem para o problema.
Desses órgãos, 11 foram reprovados no teste, incluindo a Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço (Nasa) e a Comissão Regulamentar Nuclear.
Eu lhe pergunto, Joãozinho: se nem mesmo a Nasa está pronta para enfrentar o "bug" do milênio, o que você acha que deve estar acontecendo na Brasília high-tech?
Tio Dave repete: esse é um problema SÉRIO.
O presidente do Federal Reserve Bank de Nova York avisa que, se o problema do ano 2000 não for resolvido adequadamente, o resultado pode ser uma recessão mundial.
As dimensões do problema aumentam quando se percebe que resolver a questão do "bug" do ano 2000 não significa apenas cuidar do sistema computadorizado de sua própria empresa.
Significa, também, refazer o código fonte das máquinas de todas as empresas com as quais você faz negócios. Se tudo isso não for corrigido, os dados errôneos dessas outras companhias podem ser transmitidos a seus computadores, mesmo que os eles já tenham sido corrigidos. Por exemplo, se um fornecedor de papel-jornal não conseguir entregar o papel pedido pela Folha, não vai adiantar muito a Folha estar preparada para o ano 2000.
O acima mencionado Gartner Group afirmou, no passado, que a correção de todos os softwares de computador existentes custará entre US$ 300 BILHÕES e US$ 600 BILHÕES.
Outras estimativas, que incluem os custos de novos hardwares, as interrupções forçadas de operações comerciais e os inevitáveis processos na Justiça, podem elevar essa cifra para -atenção, vista sua máscara de oxigênio- US$ 1 TRILHÃO.
Como eu disse no início, não estou inventando nada disso.

* O Macintosh é o computador dos estetas. É o Porsche dos computadores. Quando o relógio avançar para 01/01/00, o Big Mac de tio Dave não vai nem sequer piscar, muito menos entrar em pane.
Os hardwares Mac e todas as versões do sistema operacional Mac estiveram preparados para o ano 2000 desde o dia em que foram lançados. Qualquer Mac é capaz de lidar com datas situadas entre os anos 3081 a.C. e 29940 d.C. Esse prazo deve ser suficiente para todos -com a possível exceção de pessoas que aguardam cheques da Previdência.
Se você navegar até o site www.year2000.com, poderá ler muito mais sobre esse problema que, repito, é muito sério mesmo.

Tradução Clara Allain

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