São Paulo, domingo, 5 de outubro de 1997
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Papa defendeu salário digno e reforma agrária nas outras visitas

FABRIZIO RIGOUT
DA REDAÇÃO

"Papa prega justiça social": manchetes semelhantes estamparam os jornais brasileiros em 80, em 91 e de novo durante a visita do papa, que termina hoje.
João Paulo 2º chegou aqui em 80 alguns meses após a conferência dos bispos latino-americanos em Puebla, que reiterou a "opção pelos pobres" decidida em Medellín (1968) com a presença de Paulo 6º, único papa a visitar a América Latina antes de João Paulo 2º.
Condenou a desigualdade socioeconômica em seus sermões. Defendeu, em pleno fervor das greves do ABC, os direitos dos trabalhadores ao salário digno, na homilia intitulada "Encontro com os Operários", em São Paulo.
A reforma agrária foi mencionada em três discursos -no Rio, no Piauí e em Pernambuco. Para camponeses do Piauí, afirmou de improviso: "O povo passa fome, pai nosso", inspirado por um cartaz da platéia.
Em Recife, discorreu sobre a divisão da propriedade, advertindo ser a terra "um dom de Deus", não sendo "lícito, portanto, gerir esse dom de modo tal que os seus benefícios os aproveitem só alguns poucos, ficando os outros, a imensa maioria, excluídos".
O papa exaltou também, em todas as suas passagens pelo Brasil, a "diferença na unidade", doutrina ecumênica estabelecida no Concílio Vaticano 2º (principal reforma ideológica católica do século), que o país lhe parecia representar modelarmente. "Estais demonstrando com êxito como a lei fundamental do cristianismo, a fraternidade, pode levar à convivência harmoniosa e construtiva... os mais diferentes povos."
No Brasil da Guerra Fria, João Paulo 2º condenou o individualismo consumista com o mesmo vigor com que rechaçava o comunismo totalitário. "É indispensável saber vencer a tentação da chamada 'sociedade de consumo', da ambição de ter sempre mais, em vez de procurar ser sempre mais", afirmou em Belo Horizonte.
Foi incisivo ao reprovar a Teologia da Libertação, que qualificou de ideológica e radical: "A igreja não deve se deixar instrumentalizar, mas deve sempre falar".
Cada um desses temas foi abordado pelo papa como reflexão sobre as transformações sociais.
Defendeu a Igreja Católica sem se adiantar aos sintomas de suas debilidades. Por isso, em 80, João Paulo 2º não tratou do controle da natalidade. Em 91, ao contrário, o mote do sermão lido em Campo Grande (MS) foi a família unida e prolífica: "As campanhas favoráveis ao divórcio, ao uso das práticas anticoncepcionais e ao aborto... tudo isso está obscurecendo a visão cristã do amor humano".
Mantendo seu estilo moderado, versou sobre quase todos os problemas que atormentam a consciência católica contemporânea, mas evitou fazer menção direta ao crescimento das igrejas evangélicas num dos países em que elas mais crescem.

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