São Paulo, domingo, 5 de outubro de 1997
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Financiamento é solução para a crise

SÉRGIO SANT'ANNA PEGORARO

O episódio da construtora Encol, com seus desdobramentos, veio confirmar o equívoco da postura do governo em relação à questão habitacional. Sem que se pretenda reduzir a importância do episódio, de responsabilidade dos gestores da empresa, é inquestionável que ocorreu porque inexiste uma efetiva política de habitação no país.
Desde a extinção do BNH (Banco Nacional de Habitação), em 85, está configurado o descaso oficial nessa área. Salvo medidas isoladas e sem maior profundidade, os sucessivos governos deram as costas ao problema, deixando que se agravasse cada vez mais o déficit de moradias provocado pelo crescimento da população e pelo acelerado processo de urbanização.
O fim do BNH foi emblemático da descontinuidade do principal instrumento necessário à operação do setor, que é a existência de linhas de financiamento de longo prazo, a juros compatíveis.
A concessão de subsídios indevidos a mutuários, por governos populistas, somada ao recrudescimento inflacionário e à recessão econômica, determinou o afastamento dos agentes financeiros do mercado imobiliário, com o desvio dos recursos da poupança para aplicações especulativas.
Ao mesmo tempo, o dinheiro do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, que deveria financiar habitações para a população de baixa renda, foi utilizado na cobertura do déficit público. Em tal contexto, a indústria imobiliária, para não parar, buscou alternativas para garantir o acesso da classe média à casa própria, por meio do autofinanciamento. Os empresários da construção civil também precisaram virar banqueiros.
Diante do desafio, tiveram e vêm tendo notável sucesso, assegurando moradia para milhares de brasileiros e gerando significativo volume de empregos.
Ao insucesso isolado de uma Encol é preciso, portanto, contrapor o êxito de centenas de construtoras, que, apesar de todas as dificuldades, cumpriram e estão cumprindo seus compromissos.
Mas o autofinanciamento não é a saída definitiva para o problema habitacional. A solução só virá com o restabelecimento de linhas de financiamento de 20, 25 e até 30 anos, com taxas de juros nos níveis internacionais para a produção de moradias destinadas às classes de baixa e média rendas.
A estabilidade monetária e o bom desempenho da economia são dois pré-requisitos para o retorno dos financiamentos habitacionais. Não por acaso já se esboça um movimento positivo, com os agentes financeiros começando a reabrir, timidamente, sua carteira de habitação e o próprio governo instituindo o Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), que poderá ser o ponto de partida para a criação de um mecanismo vigoroso de auxilio à indústria imobiliária.
À medida que esse quadro se consolidar e o governo realmente concretizar a decisão política de dar prioridade à redução do déficit de moradias, poderemos esperar por dias melhores, representados por uma oferta de habitações em grande escala e em condições de financiamento mais acessíveis à maioria da população.

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