São Paulo, segunda-feira, 6 de outubro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Promiscuidade entre empresas de auditoria e clientes fica impune

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Investigação realizada pela Folha revela o alto grau de promiscuidade na relação entre as firmas de auditoria e seus clientes.
Apuração realizada durante dois meses identificou práticas viciadas de empresas que auditam grandes bancos e companhias abertas (que têm suas ações negociadas em Bolsas de Valores).
O levantamento realizado pela Folha mostra a impunidade e o forte corporativismo que cercam inquéritos sobre irregularidades e casos de negligência envolvendo empresas de auditoria.
Eis alguns exemplos de distorções identificadas:
-Marco Aurélio Maciel, auditor da KPMG no Banco Nacional -réu em processo criminal, sob a acusação de gestão fraudulenta e de fraudar demonstrativos contábeis- já foi absolvido por seus pares. Inquérito sigiloso no Conselho Regional de Contabilidade do Rio de Janeiro concluiu que não havia provas materiais para condená-lo.
- Já Durval Costa Millan, auditor da Ernst & Young, que assinava os balanços do Banco Econômico, foi condenado pelo Conselho Regional de Contabilidade da Bahia. Mas a decisão foi impugnada, alegando-se quebra de sigilo. O conselho da Bahia sofreu, depois, controvertida intervenção do Conselho Federal de Contabilidade.
- O Banco Boavista abusou na concessão de empréstimos em 1996. No balanço anual, otimista e apresentando lucro, a KPMG não fez nenhuma ressalva (alerta do auditor aos acionistas sobre a qualidade desses créditos).
No mês passado, o Banco Boavista foi vendido pelo preço simbólico de R$ 1. Ou seja, o prejuízo futuro estimado era superior ao patrimônio daquela instituição financeira.
- A Companhia Cacique de Café Solúvel, empresa com ações em Bolsa, publicava balanços sem ressalvas, auditados por um velho contador, dono de pequeno escritório contábil em São Paulo. E mantinha outros auditores apurando as contas com maior rigor, para consumo interno da empresa.
- A Bianchessi auditava o Banerj, enquanto uma empresa de seus sócios, a Bina Empreendimentos, era cliente inadimplente do banco.
- A Trevisan foi multada pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários), em rito sumário, por divergências entre o balanço auditado e o publicado. A auditoria também recebeu outra multa por causa de um parecer assinado por um profissional não autorizado.
- A Soteconti, firma de auditoria de São Paulo, monta sistemas contábeis em redes de hotéis e depois presta auditoria a esses mesmos clientes.
- O substituto de Clarimundo Sant'Anna (acusado de operar o bilionário esquema de fraudes no Banco Nacional) era Mário Sérgio Auler. Ele é ex-funcionário da KPMG, que auditava o banco.
- Antônio Nicolau, outro dos muitos ex-profissionais da KPMG que trabalhavam na contabilidade do Nacional, foi acusado de exercício ilegal da profissão de contador no banco dos Magalhães Pinto. Isso acontecia nas barbas do auditor Marco Aurélio Maciel, o sócio da KPMG que auditou o Nacional durante 20 anos.
Nos EUA, um auditor não pode auditar uma instituição por mais de sete anos, para evitar o relaxamento dos controles.
-Por omissão do auditor, o Econômico não registrava os balanços na Junta Comercial, o que permitia a publicação de demonstrativos com números irreais. Enquanto isso, a Ernst & Young participava de negociações para salvar o banco, confundindo o papel de auditor independente com o de consultor.

LEIA MAIS sobre as empresas de auditoria na pág. 1-13

Texto Anterior: Jornadas cariocas
Próximo Texto: Auditoria é vendida por metro, diz empresário
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.