São Paulo, segunda-feira, 6 de outubro de 1997
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Auditoria é vendida por metro, diz empresário

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

"As empresas de auditoria estão vendendo auditoria por metro", diz Ricardo Julio Rodil, sócio da firma Villas Rodil Auditores e Consultores. Rodil é um dos quatro sócios que, em 96, afastaram-se da Trevisan Auditores para montar uma nova firma de auditoria.
Por trás da cisão, havia a idéia de que os processos padronizados, importados das auditorias internacionais, não funcionam mais.
As maiores empresas de auditoria no Brasil são espécies de franquias ou dissidências das chamadas "big six" (seis grandes): Price Waterhouse, KPMG Peat Marwick, Ernst & Young, Arthur Andersen, Coopers & Lybrand e Deloitte Touche Tohmatsu.
Embora conceituadas, especialistas dizem que as seis grandes no Brasil têm qualidade profissional e ética inferiores às das matrizes.
Isso não quer dizer que as internacionais sejam imunes a críticas. Levantamento da "International Accounting and Auditing Trends", publicação especializada do setor, cita processos julgados em 12 países contra todas as seis.
A KPMG aparece como campeã em ações envolvendo principalmente negligência profissional. Mas também há casos de fraude.
No Brasil, as afiliadas das seis grandes mantêm os mesmos vícios -por exemplo, não publicam balanços, o que permitiria atestar a independência em relação a seus clientes. Elas são obrigadas a informar à CVM a relação de clientes que respondem pelo maior faturamento. Mas nem isso é feito com rigor. Recentemente, a CVM puniu a Coopers & Lybrand por atrasar suas informações.
As auditorias nacionais -como a Trevisan, Directa, Soteconti e Boucinhas- foram fundadas por ex-profissionais das seis grandes.
Os principais dirigentes de duas dessas auditorias -Antoninho Marmo Trevisan e José Fernando Boucinhas- aceitaram emprestar seus nomes e sua experiência a governos estaduais de imagem desgastada, em São Paulo.
Trevisan foi indicado para presidir a Vasp na administração Orestes Quércia, e Boucinhas foi secretário de Planejamento e Fazenda de Luiz Antonio Fleury Filho.
Trevisan publicou um parecer, com discutíveis recursos gráficos, para avalizar os ganhos de Quércia e os valores declarados ao fisco.
Boucinhas anunciou que, ao sair do governo, dividiria uma consultoria com Fleury, idéia afastada depois do massacre do Carandiru.
Auditoria é cultura
Ao lado da Price e da Arthur Andersen, a Trevisan e a Boucinhas já tiveram contratos questionados pelo TCE (Tribunal de Contas do Estado), por irregularidades como dispensa ilegal de licitações.
"No Brasil, não há cultura de auditoria. E os auditores costumam ser coniventes com o controlador das empresas que audita", diz o conselheiro Antonio Roque Citadini, do TCE.
"Enquanto não for instituída a contabilidade obrigatória em todas as empresas, eu não posso dizer que este é um país sério", diz Charles Holland, diretor da Ernst & Young, mas que prefere aparecer como diretor do Ibracon (Instituto Brasileiro de Contadores).
Holland faz uma correlação entre corrupção e auditoria. Diz que os países mais auditados -como a Nova Zelândia e Cingapura- são os mais éticos nos negócios.
Stephen Kanitz, um especialista em balanços, concorda. "Não somos um país essencialmente corrupto. Somos mal auditados", diz.
(FV)

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