São Paulo, domingo, 12 de outubro de 1997
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LIÇÃO DE CASA POR FAZER

O gradualismo na política econômica tornou-se uma das mais fortes marcas do ministro da Fazenda e, depois, presidente da República, Fernando Henrique Cardoso. Mas a virtude em excesso converte-se, por vezes, em vício ou defeito.
Tudo depende do setor em que se adota o gradualismo. A opção do governo FHC pelo estilo tímido no ajuste da taxa de câmbio ou na privatização, por exemplo, mesmo tendo sido alvo de muitas críticas pertinentes, é amplamente justificável. "Máxis" são experimentos arriscadíssimos e de dolorosa memória. Privatizações "selvagens" favoreceram a corrupção em muitos países.
Na área fiscal, entretanto, o gradualismo, a negociação recorrente, as mudanças tópicas e marginais e o adiamento de conflitos costumam ser fatais. Neste caso, pode-se falar de leniência do governo FHC, atitude que custa caro à sociedade e ao sistema produtivo. E que, em última análise, provoca um gradualismo ainda mais penoso nas outras políticas econômicas, em especial no que se refere à taxa de juros.
É fato que as grandes transformações tributárias, por serem obviamente mudanças de fundo no sistema de poder e nos interesses incrustados nas máquinas estatais, jamais ocorrem sem rupturas.
Uma autêntica reforma tributária é revolucionária: impõe mudanças na estrutura produtiva e de consumo, altera a relação entre Estados, municípios e o poder central, além de afetar a distribuição de renda. No Brasil, as maiores reformas na área ocorreram sob regimes autoritários.
Mas, até na democracia, dadas a força do presidencialismo brasileiro e a popularidade dos governantes que eliminam a inflação de um golpe, pelo menos num instante (como ocorreu com Sarney, Collor e FHC), seria possível avançar mais se houvesse mais energia reformista e disposição para quebrar resistências regionais, burocráticas e setoriais.
Na prática, congelar preços, escancarar a economia e mesmo confiscar as poupanças parecem tarefas mais fáceis que mudar o regime fiscal e o Estado brasileiro. Esta é a grande frustração, contínua e cumulativa, que se projeta como uma sombra também sobre o governo de FHC.

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